É a América Um Estado Ocidental? IV
A pergunta “É a América um estado ocidental?” não é de todo despropositada. Pelo menos se nos referirmos à matriz original que moldou o Ocidente. Dizia Jean Baudrillard que “A América é a versão original da modernidade”, querendo dizer com isto que havia abolido o passado. Abolir o passado implica abolir o futuro, porque perde-se a perspectiva temporal que nos permite projectar no futuro, planificando-o. Vive-se numa perpétua actualidade. É também esta obliteração do tempo que impede aos EUA a compreensão da importância de um planeamento a longo prazo do desenvolvimento humano em termos ecológicos. O colapso ecológico é demasiado longínquo. Quinze minutos é a medida americana. E quinze minutos até são uma eternidade no zapping televisivo, que veio substituir a reflexão. Este Império é também o Império da Imagem. Por outro lado, os EUA não são um estado mas uma federação de estados que exercem um poder global de uma forma desterritorilizada, segundo a qual o poder se exerce não através da ocupação e posse do território, mas da implantação dos grandes consórcios económicos em locais estratégicos à volta do mundo. Neste sentido assistimos ao emergir de uma nova perplexidade: um império que não tem fronteiras e que se identifica em última instância com o globo. Este império tem dentro de si o fim do estado. É certamente também por este motivo que numa altura em que a Europa se volta para o multilateralismo nas relações entre estados como alicerce de um mundo futuro, o Império do Atlântico assume posturas unilaterais. De facto, não estamos longe do tempo em que o centro e a periferia coincidirão por força da hegemonia americana. E isto é a negação do universalismo. |
Publicado por David Afonso às 02:13
Comments on "É a América Um Estado Ocidental? IV"
A questão sobre o fim do Estado (que presumo ser a favor de uma dominação completamente economizada) é altamente questionável. Não nos podemos esquecer que a ocupação do Iraque e do Afeganistão pelas forças económicas americanas se fez por obra e graça do poder militar (logo, político - "A guerra é a continuação da política por outros meios", Von Clausewitz) e esse mesmo poder militar é aquilo que vai impedir a dissolução do Estado. De outra forma, o poder militar consolidar-se-ia de forma assumidamente totalitária e formaria um Estado seu (continuava sem desaparecer) ou então os poderes económicos entrariam em guerras de guerrilha no verdadeiro sentido da expressão, com forças mercenárias contratadas, o que criaria uma instabilidade tal que não serviria os interesses desses mesmos poderes.
Além disso, por muito que os neo-liberais queiram, se o Estado não mete a mão na massa, o capitalismo pode sobreviver, mas as pessoas não... (Cf. "Manifesto contra o trabalho", Grupo Krisis, Ed. Antígona).
Prometeu
Numa sociedade militarizada, o estado é o garante do exército e não o exército o garante do estado. Essas sociedades são mais frágeis do que aparentam. Os EUA são mais complexos do que isso.
Não percebi: o capitalismo sobrevive mas as pessoas não?!
A sua primeira afirmação é exactamente o que eu quis dizer com o meu texto, mas de forma ligeiramente diferente. Porque o exército precisa de um suporte, legitima o Estado e dá-lhe apoio, (bem como ordens).
Em relação à última frase, estava a ser um pouco hiperbólico. Imaginando um cenário em que as multinacionais seriam as únicas detentoras do Poder, não demoraria muito a iniciar-se uma campanha de terrorismo ou de guerra de guerrilha, que mais cedo ou mais tarde iria descambar em guerra civil. E isso não convém nada ao capitalismo.
Prometeu
Novamente um bom exemplo do que é um conflito de ideias.