O Correio Dos Nossos Leitores
Nada como uma boa dose de poder caída no colo para se começar a entrelaçar ateia das influências. Ainda que menos folclóricas do que aquelas a que vimos assistindo pelo país acima e abaixo – Madeira, Oeiras, Leiria, Gondomar,Felgueiras, Marco de Canaveses ou Ponte de Lima – outras manhas se entretecem, de forma discreta e em souplesse. Em Dezembro de 2001, e depois de golpe de teatro nas urnas nunca cabalmente esclarecido, Santana Lopes e a sua equipa assumiram as rédeas do poder autárquico, para gáudio de uma pretensa Lisboa Feliz. Em desespero de conquista na noite fatídica de 16 de Dezembro, perdeu-se na bruma dos temposa histeria de personagens como Pedro Pinto, acusador de dedo em riste e inteligência aguçada, denunciando um “golpe” em Marvila. Afinal, bem vistas as coisas, o barrete servia na coligação PSD/PPM, à boa moda marialva de monarcas e toiros, mas a coisa arquivou-se e o saudoso engenheiro Silva Lopes definhou de frustração, como a imprensa já noticiou há semanas. Rédeas tomadas, lugares distribuídos, limpezas de balneário à boleia dos precários, salários escalonados, amigos colocados, manobrismos de ontem e hoje, muito que fazer quando se toma conta de um burgo com este tamanho.Pelo meio outdoors e cartazes sobre pavimentos, lancis, casinhotos e AltoAstral, Gehrys e folhos de corista, túneis e pistas de gelo, entre outras pérolas mais ou menos estruturais. Ainda assim, há gente que estrebucha, gente que foi levada a passear ao oásis da Figueira e que durante este mandato de ouro andou a arreganhar o dente, mesmo que fora das parangonas e dos prime-times. Os ingratos dos bairros sociais, cuja “gestão” é delegada numa entidade obscura aos olhos da populaça – a GEBALIS. Transformada num autêntico centro de emprego do PSDLisboa, este buraco negro de dinheiros públicos, à guisa de um bom argumentista de Sci-Fi, tem agraciado gentes mil, com destaque para aconsorte do senhor chefe de gabinete do Dr Santana Lopes, que aliás também é presidente de Junta de Freguesia ali a Belém. Tamanho laço familiar, até que o Senhor os separe, garantiu a Eduarda Rosa a presidência da estrutura comum salário a condizer, carros e bricabraques e uma secretária de contabancária recheada. Secretária que por divina coincidência é sua cunhada. Tal como Durão Barroso é seu compadre, aliás. Na assessoria da GEBALIS ciranda ainda João Carvalhosa, também membro do executivo na dita Junta. Mas que nãos e disperse a atenção com os favorecidos institucionais. Há outros, mais subterrâneos, que vieram cantar de galo, fazer exigências e tratar da vidinha, pois que o Dótôr assim o tinha prometido, mesmo antes de partir para São Bento e deixar o leme ao professor que ama Lisboa, sobretudo quando tem de deixar o lugar de ministro das Obras Públicas e não há melhor no horizonte. Senhores de um poder de mobilização que pode aleijar, os presidentes das associações de moradores dos bairros sociais cantaram algumas vezes de galo, com moléstias e carências. Antes que tais alvoradas saíssem para as imprensas da urbe, houve que contentar alguns líderes de algibeira. É o caso de José Moreira, Querido Líder da Associação de Moradores do Bairro dos Alfinetes e Salgadas, batalhador por causas de lixo à porta, entre outras pérolas. Há dois anos atrás, José Moreira aguçava as unhas e ameaçava com concentração de moradores e comunicação social a condizer. Cartas ameaçadoras deste divino marquês eram prato do dia e delas posso fazer chegar cópias por correio ao destino que prefiram. Ou mesmo por email, em ficheiro jpeg, o que abrevia a correspondência. Acontece que por uma qualquer razão de vulto, alinhamento de planetas ou sombra de cataclismo, o senhor José Moreira perdeu o pio e a explicação é simples: este filho pródigo passou a trabalhar para a GEBALIS, com funções mais ou menos indefinidas, estando colocado inclusive na sede da empresa. Salvaguardado o silêncio de um elemento incómodo da cidade que se (des)governa, reconheceu-se pertinência ao esquema de cala-com-emprego e neste momento também já são funcionários da GEBALIS o senhor Carlos Silva da Associação de Moradores das Galinheiras, o senhor João Bessa da Associaçãode Moradores do Bairro da Cruz Vermelha e o senhor Paulo Nascimento da Associação de Moradores do Casal dos Machados. Até lá coube o filho do presidente da Associação de Moradores do Bairro das Furnas, Pedro Silva, convenientemente filiado no PSD de Benfica. Assim se compram silêncios, assim se evitam marchas e protestos, berraria e reivindicações, concentrações e telefonemas para as redacções, traulitadas em funcionários e ai-Jesus às polícias. O povo de Lisboa quis-se feliz e mudo e quedo assiste ao despautério de Santana, Carmona, Lopes da Costa e outros irmãos de sangue e circunstância que estão em vias de dissolver amizades. Tudo sem mexer uma palha, recordando vagamente as prometidas escolas e piscinas, os jovens no centro ou o malfadado Parque das coristas em titânio pronto em oito meses, numa cidade em sangria continuada de habitantes. Ao invés de engordar os censos do município engordam-se os quadros do mesmo, mesmo que de forma enviesada. E que melhor canal do que uma empresa municipal à mão de semear, que ninguém fiscaliza? Os favores permutam-se, a areia para os olhos vai cruzando os ares. [...] Os usurários do poder alfacinha banqueteiam-se e trocam galhardetes. Eu tropeço no palavreado do Lobo Antunes e penso “Que farei quando tudo arde?”. V. Pereira, Lisboa |
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