O Estado a que chegámos
Desde que me iniciei nestas escritas, por ora escassas, sempre assinalei o 25 de Abril. Sempre julguei importante assinalar a revolução que tão pouco diz a tantas pessoas da minha geração. A revolução comemora 35 anos e é inequívoco o esvaziamento do significado desta para milhões de portugueses que na realidade nem sequer nunca se preocuparam muito com quem os governa, desde que alguém mande. Prova desse esvaziamento são as deslavadas comemorações do 35º aniversário, mas também as que se aproximam do Centenário da República. O tempo que tudo esquece e a crise económica que tudo condiciona, não são suficientes para explicar o afastamento dos portugueses do significado das mais variadas comemorações que condicionam a sua história. Embora gostemos de pensar que sim, as revoluções não são feitas pelo povo. As revoluções são feitas por grupos ou elites, que quase sempre utilizam o povo como fundamento e se propõem devolver a este o poder usurpado em nome de oligarquias e ideologias poderosas. Aos povos apenas resta aderir, retribuir e legitimar nas ruas a soberania popular conquistada. Portugal não é excepção. Da revolução de Abril, tantas vezes recordada como uma revolução conseguida sem derramamento de sangue, não resultou qualquer mudança substancial das instituições do País ou até dos seus símbolos. Todo um sistema politico fortemente enraizado implodiu num único dia, e na manhã de 26 de Abril de 74 não restava um único implicado ou responsável do Estado Novo. A bandeira ficou, o hino não mudou, a forma republicana do Estado também não. Mas além disso, ficámos com a mesma GNR, com as mesmas forças armadas que fizeram a guerra, com os mesmos tribunais e os mesmos juízes, com os mesmos autoritários e zelosos servidores públicos e de certa forma com os mesmos políticos reciclados do regime e dos que se lhe opunham. Ficámos também sem um único julgamento dos protagonistas do passado e 35 anos depois o passado volta para nos morder. Os portugueses apresentam elevadíssimos níveis de descontentamento sobre o seu sistema político e não se vislumbra que nenhuma das alternativas que preconizam possam ser vistas à luz de uma mais profunda democratização do país, antes pelo contrário. O afastamento dos portugueses das comemorações e do significado da revolução, resulta desta ter sido capturada pela classe politica que poucos anos depois de Abril se fechou sobre si própria, numa promiscuidade quase obscena de alternância democrática. Restam apenas duas opções. Ou a classe politica compreende que a esta democracia por eles protagonizada não resta alternativa senão reformar-se a partir do interior do poder, ou inevitavelmente outros reivindicarão a necessidade do poder de que são titulares, ser utilizado de outras formas. P.S.: É sempre um prazer regressar a esta casa... Etiquetas: 25 de Abril |
Comments on "O Estado a que chegámos"
É bom estar em casa, não é?
Tens aí uma boa questão: Como é possível uma revolução sem julgamento dos crimes do regime deposto?! Às tantas "revolução" é um termo demasiado vasto para expressar o que realmente aconteceu.
Fox, abraço!