Grandes Dramas Judiciários: Urbino de Freitas (20)
Estamos de volta após uma semana de interregno. Antes do episódio de hoje temos para oferecer a tradução da carta inédita de Freitas Fortuna ao Dr. Bechurts que publicámos na semana anterior. «Porto, 14 de março de 1891 Sr. Professor Dr. H. Bechurts Confirmando a minha carta de 8 do mês corrente, e a expedição de 400 francos = 323, 56 [?], apresso-me de rectificar um erro na tradução do primeiro relatório (sobre Mário G. A. Sampaio), pois desejo a máxima exactidão.Não, Sr., não quero seguir o caminho daqueles que se armaram com um revolver contra o meu bom irmão, que não resistindo a propósitos indecentes, tiveram a coragem de aceitar a missão de peritos num caso onde mais do que a vida está em causa uma questão de honra.No parágrafo 7º (reacção 6ª) “acido iódico . A reacção produziu-se, e o iodo posto em liberdade coloriu, o sulfureto de carbono, de “violeta”. A redução foi muito nítida e rápida”. É portanto "violeta" e não "verde", o único erro, que eu me obrigo a vos comunicar o mais rápido possível.Queira Sr., aceitar os meus sinceros agradecimentos pelo seu empenho em defender um homem honesto, e pai afectuoso de 5 crianças, e juntar os meus sinceros cumprimentos. J.A. de Freitas Fortuna Oporto - Portugal» ------------------- 20. Depoimento de José Joaquim Ferreira José Joaquim Ferreira, de Coimbra. Médico no Porto. - Delegado: - Gozando V. Ex.ª nesta cidade e em todo o País um nome e crédito dos mais distintos, a sua palavra deve ser tomada quási como um Evangelho. Diga V. Ex.ª o que sabe a respeito deste processo. - Testemunha: - Com relação ao processo pouco sei. Diz, porém, o que se passou com ele na casa Sampaio. Fôra chamado com urgência, na quarta-feira de Cinzas, de 90, àquela casa. Quando chegou, num quarto, à esquerda da escada, tinha acabado de morrer um menino. Verificou a morte. Foi a outra sala, onde estavam duas camas e em cada cama uma menina que lhe disseram enfêrmas. Viu-as. A do lado direito pareceu-lhe amais doente. Não tinha dados para julgar, quanto ao Mário, da causa da sua morte. Preguntou desde quando estavam doentes as meninas. Responderam-lhe que desde segunda-feira. Ficaram incomodadas, na segunda, depois de terem comido uma coisa, que lhe não explicaram logo o que fôsse. Vomitaram tudo o que comeram – sentindo iguais incómodos o Mário, a avó e a criada preta. Inquiriu se os doentes tinham sido vistos por algum colega – que não, e que aquilo lhes passara com sais de fruta. Na quarta-feira, começaram a aparecer sintomas violentos nas três crianças, ao que se segiui a morte do menino, persistindo aquelas manifestações nas duas meninas. Pelo cadáver do Mário pareceu-lhe que ele fôra vítima dum envenenamento, por ópio ou algum dos seus derivados. As doentes apresentavam sintomas que não podia ju ![]() Viu a caixa remetida de Lisboa – já lá não estavam os bolos de côco. Aconselhou a avó das doentes a que chamasse outro médico, para astratar, pois tinha de ir a Lisboa no dia imediato. - Delegado: - V. Excª. conhece venenos, ou qualquer alcalóide, que faça efeito hoje, desaparecendo esse efeito e reaparecendo 48 horas depois, sem que novo tóxico possa efectuar esse reaparecimento? - Testemunha: - Não senhor. Só por adicionamento de novo veneno. - Delegado. – O Réu aconselhou os clisteres de cidreira às crianças, dizendo que, mercê deles, elas dormiriam melhor e ganhariam forças. A cidreira tem propriedades narcóticas ou reconstituintes? - Testemunha: - Receita-se para os flatos. (Risos) - Delegado: - Ministrados os clisteres, os meninos dormiram e acordaram de manhã, o Mário com náusias, falta de vista e pêso na cabeça e a sensação de que a casa andava á roda delas. A cidreira produz esses sintomas? - Testemunha: – Não senhor. - Delegado: - O Réu aplicou-lhes novos clisteres de cidreira. O Mário reteve o dêle, morreu; as meninas, que o expeliram, estiveram prestes a morrer. À vista disto, não houve mais alguma coisa? - Testemunha: - Mais alguma coisa houve. - Delegado: - Como se lhe pode chamar? Será veneno? - Testemunha: - Será. A defesa nada quere da testemunha. O Escrivão lê o depoimento do Doutor José Carlos Lopes, a que se fazem referências em vários momentos subsequentes. Segue-se a testemunha José Carlos Godinho de Faria, natural de Tomar, médico no Pôrto. [Episódios anteriores consultáveis no blogue de apoio: Grandes Dramas] Etiquetas: Grandes dramas |
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