Marina da Barra III
A) O Preâmbulo: A propósito do post Marina da Barra fomos recebendo vários comentários quer no próprio blog, quer no nosso mail. Como é natural nestas coisas, o post não gerou qualquer unanimidade, até porque tal nem era suposto acontecer. Uns concordaram outros nem por isso. O que é certo é que vários blogues deram algum relevo ao assunto e, entre eles, o blogue de João Oliveira – Notas Entre Aveiro e Lisboa – no qual um anónimo fez um comentário muito crítico ao post publicado no Dolo Eventual. Normalmente não me daria ao trabalho de responder a alguém que se esconde no anonimato, mas duas razões obrigam-me a tal: 1º) o tom e o teor do comentário são inaceitáveis; 2º) eu próprio havia usado um comentário de um leitor que também não se identificou e que partilhava o meu ponto de vista e, nesta situação, não seria coerente da minha parte desvalorizar um comentário não assinado só porque não me era favorável. Seja lá como for, a política editorial do Dolo Eventual passará, no futuro, por não permitir comentários anónimos de maneira a desencorajar o insulto gratuito e a insinuação cobarde. Fica então aqui, pela primeira e última vez, a resposta a um ilustre desconhecido. B) O Comentário Anónimo: «Lamento que um blog como aquele que muitos vem lendo com algum agrado, embora não sempre em concordância, faça eco dum artigo de um pretenso ecologista que, pelos vistos, emparelhou com aqueles que cometeram o maior crime socio, económico ambiental da nossa região que foi impedir a construção da Marina da Barra, escudados em pretensos e mentirosos argumentos ambientais (de um ambiente a que na sua concepção o homem -o horrível e eterno predador- não deve nem pode pertencer) e mal intencionados e nojentos comentarios (ver financiado por BPN - o dinheiro deveria ser das irmãzinhas da caridade?. Ílhavo e a região de Aveiro ficaram, graças à acção deste e doutros senhores encabeçados pelo invejoso dr. Souto privadas de um pólo de desenvolvimento sócio-económico e ambiental dinamizador de toda a recuperação da Ria de Aveiro que, actualmente (e dada a situação económica que vivemos e viveremos no futuro) já não vai ser possível retomar. Algumas perguntas ficam:1- Qual é mais gravosa do ponto de vista ambiental? A marina da Barra ou a Pista do Rio Novo do Príncipe? Ou o campo de Golfe de Aveiro?2- Porque é que quando os estudos de impacto ambiental são encomendados e pagos ao IDAD da Universidade de Aveiro (leia-se dr. Borrego) são sempre aprovados e quando se encomendam os estudos a outras empresas são quase sempre chumbados e o dr. borrego aparece publicamente a falar contra o projecto - e neste caso até a escrever pessoalmente ao próprio ministro. Podemos saber quanto tem usufruido o dito prof. do IDAD (além do seu ordenado de prof.)? 3- Quem apoia financeiramente as pretensas organizações ecologistas e que interessesmovimentam? 4- Parece que o único bom projecto ultimamente feito em Aveiro foi o Estádio, executado à custa dos nossos bolsos e dos bolsos dos nossos filhos. A iniciativa privada ou as parcerias privado-público são criminosas? 4- Estes indivíduos conseguiram que se não fizesse a Marina da Barra e impediram a recuperação de parte da Ria de Aveiro. São bons a liquidar projectos. Mas o que é que já fizearm em alternativa para salvar a Ria? Quais os seus projectos? Mais especificamente que pretendem fazer aquela zona artificial em vias de eutrofização onde era para ser feita a marina da Barra. Deixar ficar como está? Deixa morrer?» C) A Resposta: Antes demais lhe devo confessar que sinto alguma dificuldade em me dirigir a alguém sem rosto e sem nome, por isso vou ter de dar um nome postiço. Artur deve servir. A partir de agora o meu caro amigo já não é um anónimo, mas o Artur. Agora que foi ultrapassada esta dificuldade inicial, vamos então ao que interessa: Caro Artur, a) Não sou, de facto, um ecologista. Pelo menos se entendermos por ecologista um activista membro de qualquer ONG vocacionada para a defesa do meio ambiente. Na verdade, sou apenas um cidadão e, como tal, exerci o direito de livre expressão, dando a minha opinião da forma o mais fundamentada possível sobre um tema que me diz muito. Talvez não habituado à regra do jogo da democracia, o Artur acha-me um criminoso só porque as nossas opiniões são opostas. b) Sobre o BPN não se percebe como viu no meu artigo «mal intencionados e nojentos comentarios»! Vá lá, Artur tenha lá a santa paciência e releia o texto. Se o fizer verá que o que lá está escrito é isto: «O que se passa é que houve uma decisão política, confortada por pareceres técnicos superiores, que contrariou as expectativas irrealistas da Sociedade de Desenvolvimento e Exploração da Marina da Barra de Aveiro (na qual o BPN tem uma posição importante).» Como vê, limitei-me a prestar uma informação, sem qualquer juízo de valor. Mas, por motivos que só o próprio Artur saberá, esta informação por si só parece ter um carácter sumamente ofensivo. c) Quanto à inveja que imputa a Alberto Souto, presidente da CM de Aveiro, devo-lhe dizer que esse tipo conversa é do mais provinciana que existe. Não sendo particular admirador desta personagem (creio até que Aveiro regrediu em alguns aspectos nos últimos 4 anos), não posso, no entanto, de deixar de concordar com a sua postura neste processo. E não me venha cá com essas guerrinhas, porque este problema não diz respeito apenas ao Concelho de Ílhavo. Para tornar mais claras as coisas, acrescento um dado que, para si, poderá ser uma surpresa: sou da Gafanha da Nazaré, logo seria um daqueles que, na sua óptica, mais iria beneficiar com o projecto da Marina, mas – oh surpresas das surpresas – não pedi e nem quero a dita Marina! d) Outra coisa em que não alinho é nessa de que a Marina da Barra seria um pólo de desenvolvimento sócio-económico. Pessoalmente, não me parece que o desenvolvimento do país se faça à custa de marinas e outros investimentos imobiliários. Não me revejo na visão de Portugal de Ribau Esteves, que um dia disse: «É preciso que o eterno discurso dos políticos portugueses passe à prática e se materialize em várias marinas da Barra pelo país». A fixação que temos na construção é uma patologia social, cultural e cultural endémica. Com a agravante de que gravitam em torno do negócio imobiliário interesses que estabelecem entre si relações de simbiose perniciosas para a saúde económica e política da nossa democracia. A relação entre a banca, os promotores imobiliários e a política já demonstrou demasiadas vezes ser pouco clara e perigosa (veja-se, por exemplo, o caso BES/CDS/Companhia da Lezírias). Em vez de investirmos no betão, seria já altura de começarmos a investir a sério na I&D. Talvez não saiba, mas investimos apenas 0,79% do PIB em I&D, ao passo que a Suécia investe 4,27%, a Finlândia 3,49% e até a Rep. Checa 1,26%! Competimos com a Grécia 0,61% e Chipre 0,32%, que devem ter excelentes Marinas! O problema é que este tipo de investimento não permite o financiamento dos partidos. e) Quanto às perguntas que fez ficam aqui as respostas possíveis: 1) Amigo Artur, vai-me desculpar, mas como chegámos até aqui já me sinto à vontade para lhe falar assim deste modo tão franco: a sua pergunta, que pretende ser um argumento, é imbecil. Sim, imbecil porque se procura demonstrar a bondade da construção da Marina, o máximo que consegue é reforçar a argumentação do adversário. Se pergunta «Qual é mais gravosa do ponto de vista ambiental?», está a reconhecer implicitamente que a Marina da Barra é gravosa para o meio ambiente e que a única dúvida que subsiste é a de saber se é mais ou menos gravosa que outros empreendimentos! Trata-se, de resto, de uma argumentação do mesmo calibre da utilizada pelo presidente da CM de Ílhavo: «O terminal químico levou-nos não sei quantos hectares de sapal e não houve nota pública de contestação ao projecto.» Em qualquer um dos casos, não se procura demonstrar a qualidade ambiental do projecto (não se pode demonstrar o indemonstrável...), mas justificar o projecto através de uma moral infantil: se os outros podem, eu também posso! Quanto à Pista do Rio Novo do Príncipe e ao Campo de Golfe de Aveiro, nisso somos capazes de estar de acordo. Contudo, não estou por dentro do assunto, pelo que lhe peço que me envie alguma informação para o meu e-mail que deixarei no final. Já agora: também faz parte dos planos de Ribau Esteves um Campo de Golfe em Ílhavo. Esperemos que mantenha o espírito combativo também relativamente a este campo de Golfe. 2) A segunda pergunta, aliás insinuação, não lhe vou responder. São acusações graves e feitas ao abrigo do anonimato cobarde. Gostaria que o Artur nos esclarecesse melhor sobre o assunto, até porque desconheço por completo a situação por si descrita. Agora, parece-me imprescindível que faça prova do que diz e que o faça dando a cara. Caso contrário, temos todos o direito de o ignorar. 3) O financiamento das ONG está devidamente legislado. Faça o favor de estudar o assunto. Todavia, o exercício de uma cidadania crítica não requer tabela de honorários e nem é passível de tributação fiscal, quem a exerce apenas está a fazer uso dos seus direitos e deveres constitucionais. Era o que mais me faltava: pagarem-me para pensar! 4) Totalmente de acordo! Mas o que tem isso a ver com a Marina da Barra? (Já disse lá atrás o que penso sobre este tipo de argumentação...) 5) Mais uma vez tenho de pedir ao Artur para reler o meu artigo. É que não excluí totalmente a hipótese da construção da Marina da Barra. O que excluí foi a possibilidade de se levar a cabo o presente projecto. As condicionantes ambientais não o permitem, ponto final! A este propósito acho deplorável que Ribau Esteves insista no projecto e que o procure legitimar no Plano de Ordenamento Multimunicipal da Ria de Aveiro. Existem alternativas e vou deixar aqui algumas: 1) Construção de pequenas marinas, despojadas do apêndice imobiliário, ao longo dos braços da Ria; 2) Reformulação do presente projecto de modo a retirar do leito da Ria as infra-estruturas de apoio (em terra existe mesmo ali ao lado o terreno da antiga seca de bacalhau); 3) Redução da dimensão do projecto, abdicando de parte significativa da componente imobiliária; 4) Se existe a intenção de requalificar o Forte da Barra e o Jardim Oudinot porque não instalar aí uma pequena Marina, a qual poderia ter apoio de infraestruturas hoteleiras que a APA pretende aí instalar? (Se a APA pretende ficar com os dois pássaros na mão...); 5) Pura e simplesmente nada construir naquele local e proceder-se à sua recuperação e requalificação ambiental. Esta última solução, que é a que eu assumo como a solução ideal, permitiria salvaguardar a única margem da Ria na Praia da Barra ainda não urbanizada. f) Alternativas não faltam e a Marina da Barra, tal como a APA e a CMÍlhavo, pretendem não é uma fatalidade. O que é uma fatalidade é a necessidade de se discutir de uma forma aberta e inteligente esta questão. Em última instância, mesmo que a administração central acabe por aceitar o projecto (o que é pouco provável), a população deve ser chamada a pronunciar-se sobre o seu próprio futuro. Em última instância, o debate exigirá um referendo local. g) Por último, meu caro Artur, como é natural, não defendo essa concepção de ambiente que me é imputada por si, a «de um ambiente a que na sua concepção o homem -o horrível e eterno predador- não deve nem pode pertencer». Não me vou dar ao trabalho de lhe explicar que ninguém, nem o mais ferveroso dos ecologistas, considerará defensável tal posição. O que se passa – e que o Artur não percebe ou faz que não percebe – é que estamos a falar de escolhas para o futuro a longo prazo, que nos comprometem: a nós e a todas gerações vindouras. A verdade é que não somos donos disto, apenas zeladores. E é tudo amigo Artur. Vá aparecendo, mas para próxima não se esqueça de trazer um nome e, sobretudo, de não perder a face. Cumprimentos, David Afonso attalaia@gmail.com |
Publicado por David Afonso às 23:33
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