O PPTP [Partido Pró-Tortura nas Prisões] e os fins das penas
Diz, em comentário, A. Neves Castanho: «Um Estado de Direito forte e consolidado deveria até permitir organizações que advogassem outra forma de organização do poder. [...] Mas a essa situação ideal deveria corresponder uma força proporcional do aparelho judicial que agisse imediata e implacavelmente contra toda e qualquer infracção à Lei - nomeadamente atentados à dignidade humana e ofensas corporais -, com penas muito severas, exemplares e sem amnistias injustificadas. Assim, qualquer ideologia deveria ser permitida - no limite, até poderia haver um Partido Pedófilo, por exemplo [...]. Ou seja, numa democracia sólida, pensar (ou propugnar por qualquer ideia) não faz sentido proibir-se.» 1. Pois. E o Estado deveria colocar nos seus quadros pelotões de fuzilamento bem treinados que acudissem às necessidades de sangue do Estado-Deus que pode dispor da vida das pessoas, [ab]usando para o efeito [d]uma pena pesadíssima sem lhe assacar nenhum fim socialmente útil. Aliás, seria talvez de propor a inscrição nos Tribunais da máxima «olho por olho, dente por dente». Poderia até ser que, com algum esforço, pudéssemos vir a suplantar o grande Irão no número de mãos decepadas. Talvez uma aliança com a Igreja Católica, pedindo o regresso da Santa Inquisição, nem fosse má ideia. Ah, gloriosos tempos da Idade Média... [Sobre os fins das penas num Estado de Direito Democrático material já por cá foram tatuados dois posts. Por óbvias razões de preguiça, remeto para a leitura deste e deste.] 2. A. Neves Castanho tem toda a razão quando afirma que, numa democracia sólida, pensar ou propugnar qualquer ideia não faz sentido proibir-se. Na verdade, tal não é proibido. Muito pelo contrário: é encorajado. A liberdade de expressão, opinião e pensamento, felizmente, é uma conquista já solidificada entre nós. Todavia, uma coisa é a liberdade de expressão. Outra coisa é usar essa liberdade de expressão criando um Partido para fins ilícitos. Ou seja: a distinção entre uso e abuso. Ele era o PP [Partido Pedófilo], ele era o PHS [Partido dos Homicidas em Série], ele era o PBC [Partido dos Branqueadores de Capitais], ele era o PPTP [Partido Pró-Tortura nas Prisões], ele era o PRPERI [Partido Racista Para Eliminação das Raças Inferiores], ele era o PPLAB [Partido Para a Legalização dos Atentados Bombistas], o PPAPEDF [Partido do Poder Absoluto Para Eliminação dos Direitos Fundamentais]. Esta espécie de organizações de meios com fins ilícitos, sim - e não a mera opinião ou pensamento -, devem ser proibidas. Sob pena de nos demitirmos da defesa da dignidade humana e do Estado de Direito Democrático material. |
Comments on "O PPTP [Partido Pró-Tortura nas Prisões] e os fins das penas"
Sem querer fazer doutrina, parece-me que o sr. Castanho confude liberdade democrática, a qual deve ter regras sob o risco de não haver democracia, com liberdade entendida de forma abstracta. Está bem que ele fala dum estado ideal e logo duma liberdade ideal mas esqueceu-se de falar dum homem ideal que, por ser ideal, não se lembraria de formar qualquer dos partidos, e podiam ser mais, que o Pedro enumera.
Com estes requisitos: estado ideal, liberdade ideal e homem ideal viveríamos, como queria Leibniz, no "melhor dos mundos possíveis".
E se houvesse esse mundo ideal não seria certamente necessário um «aparelho judicial que agisse imediata e implacavelmente contra toda e qualquer infracção à Lei - nomeadamente atentados à dignidade humana e ofensas corporais -, com penas muito severas, exemplares».
Nem mais! Seria exactamente isso.
Um possível partido como por exemplo o PPLD (Partido Para a Legalização das Drogas) deveria ser permitido ?
e o PPLA (Partido Para a Legalização de Abortos) ?
e o PPPUP (Partido Para a Proibição do Uso de Preservativos) ?
E já agora, o PPIPC (Partido Para a Instauração da Pena Capital) ?
Lembro que muita gente considera que :
- as drogas são um flagelo social,
- os abortos um assassínio,
- o sexo livre uma irresponsabilidade com consequ~encias fatais,
- o Estado não pode matar, caso contrário é igual aos assassínios.
Mário,
repara que estamos aqui a abordar a questão da criação de Partidos para fins ilícitos. E o que tu vais buscar como exemplos são casos-fronteira entre o lícito e o ilícito.
Para te ilustrar a situação:
Repara que casos há em que a ilicitude precede a lei, e casos há em que a conduta só se torna ilícita depois de crminalizada. Um exemplo: o homicídio carrega em si um desvalor social de acção e de resultado tão grande e forte que será considerado socialmente ilícito ainda que não haja lei que o criminalize; por outro lado, o uso de preservativos só será considerado socialmente ilícito se uma lei o disser, já que se situa numa zona de fronteira de acteitação/não aceitação social. Tal como o aborto. Tal como a pena capital, (esta, em menor medida).
Ora, uma organização de meios deverá ser proibida apenas nos primeiros casos, onde a ilicitude precede a criminalização. Quanto aos segundos casos, são perfeitamente admissíveis no nosso Estado de Direito Democrático (acaso não há partidos que defendam a legalização do aborto?; acaso não poderá haver, entre nós, partidos que defendam a proibição do uso de preservativos?; acaso não poderá haver entre nós pessoas que defendam a pena de morte?).
Por isso, os teus exemplos deveriam ter sido outros.
Abraço.
PS: Ainda não te pronunciaste sobre um eventual jantar, lá em baixo. ;-)
Pedro,
O meu ponto é precisamente que a sociedade não é capaz de estabelecer quais os casos em que a ilicitude precede a lei.
É óbvio que os nazis não têm boas intenções. É óbvio que as reuniões do PRPERI [Partido Racista Para Eliminação das Raças Inferiores] só poderiam ser para determinar quais as raças inferiores e como eliminá-las, é óbvio que o PBC [Partido dos Branqueadores de Capitais] só se reunia para inventar novas formas de roubar, etc, etc.
Mas o que é que fazemos com os restantes casos em que o ílicito não é obvio ?
Mas vamos continuar esta conversa à volta de um tinto ... :-)
Abraço
Mário,
não percebeste o meu anterior comentário. Vá lá, lê-o outra vez.
A sociedade estabelece os casos em que a ilicitude precede a lei numa ordem natural. Não é preciso, por exemplo, haver lei, para a sociedade, naturalmente reprovar um homicídio.
Quanto aos casos em que o ilícito não é óbvio - os que necessitam de uma lei que os torne como tal para socialmente o serem, como o consumo de haxixe, por exemplo -, estes são perfeitamente admissíveis ao debate no nosso Estado de Direito Democrático.
Quanto ao jantar ou almoço, falta acertarmos os pontos, então.
É inútil discutir asim...