Grandes Dramas Judiciários: Urbino de Freitas (10)
O caso Urbino de Freitas alimentou durante muito tempo uma acesa polémica na imprensa generalista e especializada. Quer a opinião pública em geral, quer os os próprios especialistas das várias áreas (da Medicina ao Direito) dividiram-se em torno dos vários aspectos ligados a este crime. Mas não foi apenas na imprensa da época que este caso foi tratado e discutido com maior ou menor rigor, com maior ou menor paixão. Desde logo se começa a produzir uma extensa bibliografia sobre o caso. Uma rápida pesquisa pela produção livreira da época permitiu-nos constatar isso mesmo. A partir de hoje vamos dar a conhecer, em jeito de complemento, alguma dessa bibliografia e, como é natural, estamos abertos a sugestões por parte dos nossos leitores. Eis então o primeiro exemplar da Urbiniana: ![]() SOUTO, Dr. Agostinho António do; AZEVEDO, Joaquim Pinto de; PINTO, Manoel Rodrigues da Silva; SILVA, António Joaquim Ferreira da - O Caso Medico-Legal Urbino de Freitas: Observações e criticas. Relatórios. Documentos. Edição portuguesa. Porto: Imprensa Portugueza, 1893 --------------------------- 10. Os especialistas e a polémica O exame pericial à letra do enderêço e da guia da encomenda realiza-se a 29 de Abril. Peritos: - os tabeliães Tomás Megre Restier, Manuel Vieira da Silva e Sá e Ribeiro da Silva. Ordenado ao arguido que escreva, por seu punho, os dizeres do enderêço e da guia, os peritos afirmam que há semelhança aparente nalgumas letras e que estão outras sensivelmente disfarçadas. A semelhança verifica-se, especialmente, nos ee, nos oo, nos ll, nos ss. Peritos do exame e análise às vísceras dos cadáveres autopsiados: - Agostinho António de Souto e Manuel Rodrigues da Silva Pinto, Lentes da Escola Médica, Joaquim Pinto de Azevedo, Preparador de Anatomia da mesma Escola, e António Joaquim Ferreira da Silva, Lente da Escola Politécnica. Êstes apresentam o seu relatório a 7 de Outubro do ano em curso. Dêsse relatório consta que o exame e a análise incidiram sobre as vísceras extraídas do cadáver do Mário na primeira e na segunda autópsias. Quanto às da primeira, dizem acusar a existência de morfina e narceína, as «reacções químicas a que as submeteram, dão-lhes indícios da existência, nas mesmas vísceras, duma base orgânica que, pelos caracteres químicos, se aproxima da delfin ![]() Os advogados de defesa recorrem para a Relação do despacho de injusta pronúncia. E chamam a conferência, ao Pôrto, o Médico Augusto Rocha, Lente de Medicina da Universidade de Coimbra, Director da revista Coimbra Médica, revista de que Urbino fôra notável colaborador. Convidam-no «a estudar o capítulo médico-legal do processo e a elucidá-los com o resultado dêsse estudo» - o que consta, subscrito pelo próprio Doutor Augusto Rocha, do Suplemento à Coimbra Médica de Abril de 1891. «Quem o acompanhara (ao arguido) durante oito anos na bancada das escolas» - avança Augusto Rocha - «não se achava com fôrças de recusar á defesa os elementos pudesse, em consciência, ministrar-lhe». E aceita a cooperação na defesa de Urbino mediante duas condições: - a colaboração de Joaquim dos Santos Silva, chefe dos trabalhos práticos do Laboratório Químico de Coimbra e «a consulta a eminentes toxicologistas do estrangeiro» - entre os quais cita professores e peritos de Berlim e Brunswich. Aceitando a cooperação na defesa, Augusto Rocha e Joaquim dos Santos Silva desfraldam a bandeira do patrocínio nas colunas daquele Suplemento, lançando-se ao ataque contra o relatório e peritos, provocando a cisão e a discórdia públicas entre os inumeráveis possessos de paixão pela causa emocionante, o que origina o recrutamento dos dois partidos antagónicos que, desde essa hora, se digladiam, pró e contra Urbino de Freitas – partidos ainda hoje em campo, ainda hoje a anatematizarem de ineptos, de imorais, de vendidos todos os filiados nas hostes contrárias a cada um dos fogosos credos.
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