Um dia destes, a música que animava a sede de campanha de Rui Rio era o hit telenovelesco «Você não vale nada mas eu gosto de você». Não vou sequer tentar compreender os sinuosos caminhos do marketing político que levaram a isto, mas acredito que esta declaração de amor seja partilhada pelo eleitorado laranja, isto é, acredito que todos os que votam no Rui Rio fazem-no apesar de conhecerem bem as limitações do candidato. As eleições são também uma questão de afecto, já se sabe, mas seria bom que parássemos para pensar um pouco. Acredito que Rui Rio, Elisa Ferreira e Rui Sá estão perfeitamente aptos a exercer a presidência da Câmara e que Teixeira Lopes daria um formidável vereador (com ou sem pelouro). Não serão candidatos de sonho, mas é o que se arranja e é com eles que temos de nos entender.
Ao contrário do TAF, não votarei Rui Sá apesar de apreciar muito positivamente o seu trabalho na oposição (se ignorarmos uma ou outra atoarda, mas de resto, quem não as comete?) porque ainda não lhe perdoei o facto de se ter coligado no passado com o CDS-PP e PSD e de agora concorrer de novo e de uma forma calculista ao pouco invejável posto de muleta (seja lá de quem for).
Não votarei de igual modo no Teixeira Lopes apesar de toda a simpatia que me merece. O BE precisa de criar lastro e de crescer nas autarquias e este candidato seria certamente uma mais-valia em qualquer equipa de vereação. Simplesmente, será vítima do meu calculismo eleitoral. É que os tempos não estão para brincadeiras, como quase todos os candidatos reconhecem. Em todo o caso – e pensando mais no país do que apenas no Porto, não deixarei de votar BE para a Assembleia Municipal (o trabalho de José Machado de Castro é digno de nota) e Junta de Freguesia porque o partido parece ter chegado ao limiar da esfera da governação e, mais cedo ou mais tarde, não deixará de ser chamado a assumir as suas responsabilidades, pelo que precisa, a bem do país, de começar a formar quadros políticos capazes e essa formação faz-se, em grande parte, pelo exercício do poder autárquico.
Chegados aqui, não será difícil adivinhar em quem votarei, mas deixem-me explicar porque razão não posso votar Rui Rio. Começo por reconhecer que não virá mal de maior ao mundo se Rui Rio vier a ser reeleito. Mais quatro anos, menos quatro anos não é nada para uma cidade que sobreviveu ao cerco, às invasões francesas, a séculos de centralismo sulista e, convém não esquecer, a oito anos de governo PSD/CDS-PP nos quais devo reconhecer democraticamente também algumas virtudes e não apenas defeitos. O problema é outro: 1) A boa governança das cidades reside na promoção e manutenção da coesão das redes sociais, culturais e económicas que a constituem. Governar é suturar. É um trabalho para o qual se exige um certo talento democrático não compatível com uma atitude de conflito como modo de vida; 2) De ruptura em ruptura estava à espera que Rui Rio tivesse a coragem de avançar para a ruptura final, rompendo com a sua própria propensão para o conflito e com uma parte substancial das suas políticas. Todavia, em vez disso, declara-se satisfeito consigo próprio e reencaminha praticamente a mesma equipa. A imagem transmitida não é, infelizmente, a de um líder resoluto mas de um político resignado. No horizonte do Porto não se adivinha nada de novo e «daqui a cem anos ainda existirão problemas por resolver» esclarece-nos o candidato. Diria que Rui Rio foi tomado por uma estranha forma de nihilismo administrativo: a cidade é para se ir governando, não se espere que se faça alguma coisa dela. 3) Para além disso, Rui Rio tem dado sinais preocupantes de ventriloquismo político dado que tem verbalizado posições que são mais próprias do seu parceiro de coligação do que da tradição social-democrata. Foi um momento particularmente arrepiante ver a cantiga do RSI cantada a duas vozes entre Rio e Portas. Aliás, a canibalização do PSD pelo CDS-PP poderá se estender bem para lá do mero discurso político: Se Rui Rio abandonar a Câmara para desempenhar outras funções, será o seu número dois e representante do CDS-PP a assumir a presidência da Câmara? O que pensará disto a cidade? E os sociais-democratas?
Sobra-nos Elisa Ferreira. Não será a candidata ideal pelas razões sobejamente conhecidas e, de resto, exploradas até à náusea pela concorrência, mas trata-se da única candidatura que procura desenhar um horizonte de esperança para a cidade. O currículo de Elisa Ferreira fala por si e apresenta-se rodeada de uma equipa muito capaz (muitos, muitos, muitos pontos acima da equipa de Rui Rio) que não envergonharia nenhum governo nacional. O facto de não ter o apoio do PS-Porto não fragiliza em nada a candidata, bem antes pelo contrário: a avaliar pelos rumores que saem do interior do aparelho socialista portuense, Elisa Ferreira não poderia arranjar melhor carta de recomendação do que esta. Por mim, já chega deste Porto ensimesmado. Fico, como sempre, do lado dos optimistas.