Dolo Eventual

David Afonso
[Porto]
Pedro Santos Cardoso
[Aveiro/Viseu]
José Raposo
[Lisboa]
Graça Bandola Cardoso
[Aveiro]


Se a realização de uma tempestade for por nós representada como consequência possí­vel dos nossos textos,
conformar-nos-emos com aquela realização.


odoloeventual@gmail.com


Para uma leitura facilitada, consulte o blogue Grandes Dramas Judiciários

Visite o nosso blogue metafísico: Sísifo e o trabalho sem esperança

O Dolo Eventual convida todos os seus leitores ao envio de fotografias de rotundas de todos os pontos do país, com referência, se possível, à sua localização (freguesia, concelho, distrito), autoria da foto e quaisquer dados adicionais para rotundas@gmail.com


Para uma leitura facilitada, consulte o blogue As Mais Belas Rotundas de Portugal


Powered by Blogger


Acompanhe diariamente o Dolo Eventual

sexta-feira, abril 29, 2005

Miguel Sousa Tavares

A propósito ainda da sentença do Tribunal de Ponta Delgada que condenou a rede pedófila, na qual o tribunal se recusou a aplicar o artigo 175º do Código Penal por violação do princípio da igualdade (v. o meu artigo "Inconstitucionalidade"), Miguel Sousa Tavares [MST] escreve na sua crónica de hoje no Público:
"O que o tribunal fez foi dar preferência ao direito à orientação sexual do pedófilo sobre o da própria vítima. Aquele poderá ser o que quiser e o que a Constituição e a lei lho permitam. Mas, quando se abusa de uma criança, é aberrante que a sua orientação sexual se imponha ainda à da criança - que, em muitos casos, não está ainda sequer definida. Ou o tribunal achará que para um rapaz de 10 anos, por exemplo, é igual o trauma de ser abusado por uma mulher ou por um homem? Esta sentença revolta e indigna."
Discordo plenamente. Transcrevo aqui o princípio da igualdade, talqualmente se encontra definido na nossa Constituição:
(Princípio da igualdade)
1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.
O princípio não proíbe que haja diferenciações na lei. O que é vedado pelo princípio é, sim, por um lado, o arbítrio, i. é, diferenciações de tratamento sem um fundamento material razoável segundo critérios de valor objectivo. Por outro lado, proíbe ainda a discriminação - parafraseando, proíbe distinções de tratamento apoiadas em categorias meramente subjectivas, tais como as que são indicadas, não exaustivamente, no n.º 2 do artigo 13º da Constituição (onde se inclui a orientação sexual).
Por aqui já se compreende não haver fundamento material razoável para a distinção estabelecida nos artigos 174º e 175º do Código Penal. As condições de punibilidade da conduta do homossexual são desproporcionadamente mais gravosas em relação à do heterossexual, i. é, a fronteira da punição ou não punição, em certas condições referidas no meu artigo supra referido "Inconstitucionalidade", é traçada consoante a orientação sexual do abusador. O tal fundamento material razoável, para Miguel Sousa Tavares é o de que uma criança sofrerá maiores traumas se for abusada por uma pessoa do mesmo sexo. Mas como é que MST sabe? E se é assim em muitos casos, não haverá casos em que se verifique a situação contrária? E, nestes últimos casos em que a criança sofre menos traumas com uma relação homossexual, já será de recusar a aplicação da norma? De um outro ângulo, o que está aqui em jogo é a punição pelo direito penal de uma conduta atentatória do bem jurídico "autodeterminação sexual", não a avaliação do quantum de trauma sofrido pela criança, consoante tenha sido violada por um homem ou por uma mulher - quantum, esse, indeterminável. Subjaz aqui, parece, ao pensamento de MST, uma certa concepção moral cada vez mais ultrapassada, eivada em axiomas tais como "seria um trauma para a criança ser adoptada por um casal homossexual". Ora, fundamento material razoável aqui não há.
Por outra via, o princípio da igualdade proíbe distinções de tratamento fundadas em categorias meramente subjectivas, de que é exemplo a orientação sexual. Ostensivamente é o que faz o artigo 175º do Código Penal.
Por último, será de referir que o Acórdão de 9 de Janeiro de 2003 do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (caso n.º 45330/99) considerou que um preceito, entretanto revogado, do Código Penal austríaco, semelhante ao actual artigo 175º do Código Penal português, atentava contra direitos consagrados na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, bem como já deram entrada na Assembleia da República propostas de lei no sentido da revogação do preceito.
Em suma, reafirmo o meu aplauso à recusa de aplicação deste artigo por parte do tribunal de Ponta Delgada. E a minha veemente discordância com MST, que de quando em vez tira estes coelhos da cartola.

Etiquetas: ,

Um Blog Tanto De Patético Quanto De Original No Uso Carregado De Frases Muito Coloridas

http://josemariamartins.blogspot.com/

Partidos: Há vida antes da morte?

Como se fossem de animais doentes, mas que não nos atrevemos abater por compaixão ou por falta de coragem, os partidos morrem sossegadamente no seu canto. Assistimos distraídos aos últimos dias desses grandes animais cívicos, que habitaram e dominaram as terras da ocidentalidade. Primeiro, começaram por perder a política e a ideologia, depois foram perdendo os militantes, as sedes foram abandonadas às traças; da memória ficaram apenas o material de campanha financiado por um colégio de empreiteiros e que nunca viu a luz do dia (as jotas foram as primeiras a desertar...) e as fotos amareladas dos fundadores (em alguns nem isso...). Há vida depois da morte? O que acontece aos partidos quando morrem? Tornam-se aparelhos. E agora a pergunta é outra: Há vida antes da morte?

quinta-feira, abril 28, 2005

Inconstitucionalidade

No caso de pedofilia dos Açores, o Tribunal de Ponta Delgada furtou-se ontem a aplicar o artigo 175º do Código Penal, considerando-o inconstitucional por violação do princípio da igualdade (artigo 13º da Constituição da República Portuguesa [CRP]). Só posso aplaudir.
Comparemos os artigos 174º e 175º do Código Penal:
Artigo 174º
Actos sexuais com adolescentes
Quem, sendo maior, tiver cópula, coito anal ou coito oral com menor entre 14 e 16 anos, abusando da sua inexperiência, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.
Artigo 175º
Actos homossexuais com adolescentes
Quem, sendo maior, praticar actos homossexuais de relevo com menor entre 14 e 16 anos, ou levar a que eles sejam por este praticados com outrem, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.
Para actos heterossexuais, para que o agente seja punido, é necessária cópula, coito anal ou coito oral; para actos homossexuais, basta actos sexuais de relevo. Para actos heterossexuais, é necessário que se abuse da inexperiência do menor; para actos homossexuais não. Apenas no artigo 175º existe o segmento "... ou levar a que eles sejam por este praticados por outrem".
É manifesta a inconstitucionalidade por violação material do princípio da igualdade.
Nos termos do artigo 204º da CRP, "nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados".
Muito bem.

Etiquetas: ,

quarta-feira, abril 27, 2005

Memórias

Estas são algumas frases que fizeram história no meu percurso académico. Foram proferidas por um ex-professor meu, do segundo ano da faculdade, infelizmente já falecido há três anos:
1. "Portugal vai comprar três submarinos para enfrentar o tenebroso inimigo subaquático".
2. "Nunca gostei da palavra auto-consumo. Faz-me lembrar [aqui simula que está a comer as próprias mãos]. Prefiro consumo próprio."
3. "Nunca percebi bem por que é que as urnas se chamam urnas. Deve ser porque os votos morrem lá dentro."
4. [Entrámos na sala e, qual o nosso espanto: o professor acabava de desenhar uma galinha gigante cor de laranja. Depois da sala composta, disse, insurgindo-se contra um autor que no seu livro escrevia superave, ao invés de superavit:] "Esta é a superave."

Let my people go!

O que eu sei acerca de Timor é o mesmo que a maioria dos portugueses sabe. Não basta, é certo, mas é o suficiente para estabelecer uma empatia e preocupação para com o futuro desse povo. Nos jornais tenho lido – meio aparvalhado, meio revoltado – que a Igreja Católica tem vindo a pisar o risco. No Público de terça-feira, 26 de Abril, lê-se: «Bispos de Timor exigem demissão do primeiro-ministro». Parece que os bispos de Timor teimam em desconhecer o principio elementar da separação do Estado e da Igreja. A mesma modernidade que permitiu a liberdade de Timor Lorosae não pode agora ficar, convenientemente, à porta. O que está em causa é a ideia matricial de laicidade do estado. Justamente a mesma que permitiu que as nações ocidentais acudissem a um território ocupado por uma nação maioritariamente muçulmana. Não foi em nome do catolicismo que Portugal, Austrália, EUA e outros, ajudaram os timorenses, mas em nome da Liberdade e da autodeterminação cívica, política e económica. Mais grave ainda é a motivação do atrevimento dos prelados: não aceitam que a disciplina de Religião e Moral seja facultativa! Já que somos o maior país doador, talvez também fosse altura de a Igreja portuguesa doar algum juízo aos desorientados (des-orientados?!) prelados de Timor. Eu sei, eu sei: é o roto a falar ao esfarrapado; mas por cá a bicharada de sotaina já anda mais mansa, mais civilizada, apesar de tudo (que ainda é muito...).
Não vale a pena um povo se tornar num escolho na história. É verdade que a independência da nação mais jovem do mundo se deve muito à influência do Vaticano, mas esta é a hora de deixar o seu povo partir e confiar na parábola do filho pródigo. Mas isto é uma questão de fé, a qual não tem nada a ver com questões de poder, que são aquelas que verdadeiramente estão em causa.

TIMOR LIVRE E LAICO JÁ!

domingo, abril 24, 2005

A Frase Do Dia

"O objectivo do meu pontificado não é cumprir a minha vontade, não é impor as minhas ideias, mas ouvir, em conjunto com toda a Igreja, o mundo e a vontade do Senhor."
Papa Bento XVI, 24-04-2005 in http://www.publico.clix.pt
O Vaticano ordenou ("Não é facultativo. Todos os cristãos devem estar dispostos a pagar o preço mais elevado, inclusive a perda do emprego") aos notários cristãos que invocassem objecção de consciência para recusar a realização de matrimónios homossexuais em Espanha.
O Vaticano é autistamente insistente na proibição do uso do preservativo, ainda que consciente do preço a pagar. Não em euros. Em vidas humanas.
Joseph Ratzinger instou à necessidade de combater a nova "ditadura de relativismo" da modernidade, durante a missa que antecedeu o início do Conclave.
A Igreja Católica Apostólica Romana, na sua autofagia, não compreende que ouvir o mundo implica necessariamente o diálogo, não o monólogo inútil. Aguardo espectante estatísticas de quantos funcionários públicos espanhóis se recusaram a realizar matrimónios homossexuais - embora uma pequena amostra do seu universo de influência, será um indicador da verdadeira autoridade do Vaticano sobre os seus fiéis. Desconfio que serão poucos.

Uma Jornalista Que Não Faz Falta

Manuela Moura Guedes.

Outro Poema

Se te vejo verde
penso-te azul,
toda a cor em que vens
soprar-me ao ouvido
a cor que és,
é outra,
é sempre outra
daquela que te penso.

sábado, abril 23, 2005

Um poema

No dia que em que tudo voara,
no sopro que te levara
longe daqui,
eu vi.

Eu vi-me, ali,
soprando
brando
o momento da palma da mão,
vento que me levara o futuro
além do muro,
e me trouxera o pretérito perfeito
feito memória,
distante história
de um fado falado
no passado.


O momento voa-se-me da palma da mão,
sou eu que o sopro
e não consigo deixar de o soprar.

sexta-feira, abril 22, 2005

Lendo o Público

1. Público, hoje, primeira página: "Ele é da raça humana". Esta frase refere-se ao filme de Oliver Hirschbiegel "A Queda", sobre Hitler e a derrota do III Reich. Trata-se de um filme polémico que aborda não apenas a face fria e cruel do Führer, mas também o seu lado humano - daí o "Ele é da raça humana". Porém, a raça é uma subespécie, grupo natural que apresenta em comum um conjunto de caracteres hereditários (raça branca, raça negra...). Melhor seria que a frase do Público fosse "Ele é da espécie humana".
2. Parece que o novo Papa já tem e-mail - benedictxvi@vatican.va. Ajudem-nos, mandem-lhe mails a recomendar o Dolo Eventual. Parece que ele compreende português, a língua não seria obstáculo. Vou tentar saber os mails do Dalai Lama, do Bush e do Robert Mugabe. Este blog vai aquecer.
3. A Volkswagem pretende fabricar o papamóvel blindado para Bento XVI, o que me fez ter uma ponta de nostalgia em relação ao meu pedromóvel, da Peugeot, vendido no ano passado.
4. Ainda Ratzinger: há uns anos, o ex-cardeal respondia a uma jovem: "O anjo da guarda, para que serve?" "Os anjos são, por assim dizer, os pensamentos de deus que regressam a nós. Enquanto pensamentos divinos, não são ideias, mas realidades, pessoas... incarnam e concretizam a solicitude de deus por cada homem". Logo, quando uma pessoa mata, viola, agride, rouba, faz ou pensa coisas ainda piores, conclui-se que os anjinhos foram tomar café.
5. Como adepto das liberdades e dos direitos fundamentais que sou, embora sendo heterossexual e o assunto, ipso facto, não me tocar directamente, não posso deixar de saudar a aprovação pelo Parlamento espanhol do casamento entre homossexuais, bem como a possibilidade de adopção conjunta pelos mesmos.

quinta-feira, abril 21, 2005

O Bicho Papão

Algo correu muito mal para os lados do Vaticano: pediu-se um Papa e serviram-nos um papão!

A Origem Da Fé

O exército de escaravelhos está em desvantagem de onze para um em relação ao exército de gafanhotos. Mas os bravos escaravelhos têm o moral elevado, estão confiantes na vitória esmagadora: eles aguardam a chegada de Cosme, o Escaravelho Messias – O Enviado - que, com os seus impenetráveis super-poderes, os haverá de salvar e conduzir à vitória, certamente. Certamente que sim.
O dia da batalha decisiva chegara. O exército de gafanhotos avançava em linha, num rectângulo, em estilo romano. O exército de formigas parecia microscópico, de uma vista aérea, quando comparado com o de gafanhotos.
Nisto, das sombras, chega Cosme. Usando apenas quase nada das suas forças, o Escaravelho Messias, todo-poderoso, matou toda a população de gafanhotos com um sopro, apenas.
(Esta história foi narrada por um velho escaravelho alucinado, único sobrevivente do massacre perpretado pelos gafanhotos aos escaravelhos. O velho reza todos os dias ao Enviado. Mas nunca houve Enviado algum.)

quarta-feira, abril 20, 2005

Curiosidade 2

Pequena notícia/artigo de opinião retirado d’O Jornal do Povo (Porto) de 18 de Julho de 1850:

«A extincção das gallinhas vadias foi decretada nesta cidade. Os zeladores da exm.ª camara são os executores desta medida. Não nos importa agora a convenniencia della; concederemos até, se quizerem, que é mui acertada. O que porem não podemos deixar de censurar é o modo porque a vemos levada a effeito. Andarem por ahi os zeladores a cercar as aves banidas, e a matal-as com pedras e paus de arrojento, e apoz isso as longas jaculatórios das mulheres ou donos das aves, que aqui não podemos copiar, mas que quem quizer pode ouvir a cada passo: é um espectaculo bem pouco digno d’uma cidade policiada.
A medida é boa, mas escogitem um meio melhor de a effectuar.»

Lei do Financiamento dos Partidos

A limitação dos mandatos dos presidentes de câmara, dos presidentes das regiões autónomas e do próprio primeiro-ministro é uma boa decisão política. Existem dúvidas sobre a legitimidade de se limitar a duração da posse de cargos relativamente a estes dois últimos casos. De facto, não são eleitos directamente pelos portugueses, o que torna a questão melindrosa, mas não inultrapassável. O ideal seria também estender esta limitação aos vereadores, dado que muitas das vezes é neles que é delegado parte substancial dos poderes do presidente da câmara. Mas é um princípio. Quanto aos deputados à Assembleia da República talvez não haja essa necessidade ou, havendo limitação, que esta fosse mais alargada.
Mas é preciso ter em consideração que esta lei, por si só, vem apenas acelerar a renovação dos quadros políticos, o que poderá ter um efeito positivo no regime democrático. E mesmo assim é difícil que isso aconteça porque existem muitas formas encapotadas de se exercer o poder.
Também há quem diga que esta lei teria o condão de precaver a corrupção, acautelando os vícios gerados pela eternização das mesmas pessoas no poder. Eu acho que não. Quanto muito vem democratizar o acesso à corrupção. Isto se esta lei funcionar sozinha. Em simultâneo deveria o nosso 1.º ministro preparar uma nova lei do financiamento dos partidos. Sabe-se que as autarquias funcionam como vasos capilares que alimentam os partidos. É à escala do Concelho que são recolhidos fundos não declarados que permitem aos partidos e aos corruptos sobreviverem. Quando um empreiteiro dá dinheiro por debaixo da mesa, não está a fazer uma doação. Por mais convicto que seja da sua militância partidária, a verdade é que ele está a fazer uma compra: o favorecimento desleal. Todos sabemos que Fátimas Felgueiras e sacos azuis são a regra e não a excepção. A defesa do bem comum exige que o financiamento dos partidos passe a ser feito às claras, podendo até ser descontado no IRS/IRC, e que passe a existir um registo público dos lobbies económicos que existem por detrás de cada partido. Desse modo, quando o eleitor desse o seu voto a um partido, sabia de antemão que estaria também a apoiar um determinado sector ou grupo económico. Na prática isto já acontece, mas às escondidas. Deixem a verdade vir ao de cima e verão como a corrupção política descerá como por magia.

terça-feira, abril 19, 2005

Um Jornal Que Não Faz Falta

O 24 Horas.

O Outono do Professor

O Prof. Marcelo anda cansado. Não é tão fácil bater no Sócrates, como no Santana ou até mesmo no Durão. É fácil ser contundente com os amigos, principalmente quando estes tudo fizeram para que o Professor tivesse assunto para a cavaqueira dominical. Agora com estes socialistas a coisa pia mais fino. São tão discretos que nos esquecemos deles. Isto deixa o Professor muito preocupado. Afinal de contas trata-se de um animal político que se alimenta dos despojos e lixos alheios. E estes socialistas são muito higiénicos. A coisa é grave. Tão grave que ameaça de extinção o pobre Professor. Para quê precisamos nós de um necrófago político? Para sugerir, com aquele ar de omnisciência minhota, que o limite de validade dos presidentes de câmara deveria ser de oito em vez de doze anos? Para ajudar o Alberto João a manter a pata sobre a Madeira? Para corrigir o português dos ministros? O Outono pode ser uma estação muito triste...

segunda-feira, abril 18, 2005

Media

É estranho o facto de os meios de comunicação social não se terem debruçado ainda sobre grandes reportagens e longos fins de telejornal acerca dos compostos químicos quer do fumo branco quer do fumo negro que anuncia o resultado conclave.

É a América Um Estado Ocidental? Conclusão

O mundo está a mudar. O ocidente já não é mais o mesmo ocidente. Dentro de si está a nascer a sua própria negação. Uma nova matriz civilizacional vai tomando o lugar. Podemos considerá-la uma degeneração, uma espécie de ampliação dos nossos próprios defeitos, o que é irrelevante porque muito de cada um de nós é já americano.

domingo, abril 17, 2005

O Soro da Verdade


Mswati III, Rei da Suazilândia
Posted by
Hello

Alberto João Jardim, num destes carnavais, aproximou-se da nona barraca de bebidas. Só que o dono, Sr. João Mataco, por distracção, trocou os copos e acabou por vender a Alberto João não o tinto que lhe tinha sido pedido, mas um potente soro da verdade.
Desde então o dirigente madeirense só fala o que lhe vem à cabeça. O pior não é isso, o pior é que o que lhe vem à cabeça são nódoas. Logo após o primeiro trago no soro, Alberto afirmou a sua profunda admiração por Mswati III, Rei da Suazilândia, e confessou até uma pontinha de inveja sua. Alberto João elogiou, particularmente, o seu modo visionário de governar, numa referência ao seu projecto de lei para travar a sida no seu país - em cujo articulado se previa a proibição de relações sexuais durante 5 anos por parte de todas as mulheres solteiras, tendo-se previsto igualmente a obrigatoriedade de as virgens usarem vestimentas azuis e pretas com os dizeres "não me toque", sendo que as comprometidas e as maiores de 19 anos teriam cores diferentes. Ficou estabelecida uma vaca como multa para os infractores. João Jardim elogiou, por outro lado, a rica tradição cultural que consuetudinariamente se fortalece naquele país. Manifestações artísticas anuais como a dança das virgens com os seios descobertos para o monarca escolher a sua próxima esposa (segundo os últimos relatos já ia em 13 casamentos aos 36 anos; o seu pai casou perto de uma centena de vezes), fazem daquele próspero reino o sonho de Alberto João para a Madeira.
Isto, no primeiro trago. Com o passar dos anos o efeito do soro tem-se acentuado, e Alberto João Jardim já não se controla.

É a América Um Estado Ocidental? V

Mas o que preocupa mais é a perda do compromisso com a Razão. Não existe maior potência científico-tecnológica. Todos os cérebros do mundo convergem para as universidades norte-americanas. Nenhum ensino é tão dirigido em função do paradigma empírico-crítico como o norte-americano. Nenhuma outra nação investiu tanto em investigação científica. No entanto, os estados da chamada Bible Belt continuam a renegar as teorias evolucionistas, o governo acredita que a abstinência sexual é o mais eficaz dos métodos anti-conceptivos, os laboratórios são dominados pelas multi-nacionais e os cidadãos desconhecem em absoluto a diversidade e a especificidade do mundo que [ainda] há fora da América. Trata-se de um povo infantilizado por uma moral maniqueísta que necessita do esquema herói-vilão para tornar o mundo inteligível. Vivem a ética das crianças: só é bom o que é bom para mim, já!

sábado, abril 16, 2005

A Mesa e a Cadeira Passando o Tempo

A mesa para a cadeira: Sabes que horas são?
A cadeira para a mesa: Não. Será que falta muito até que eles se venham sentar?
A mesa para a cadeira, encolhendo os ombros: Não sei as horas, ainda não vieram almoçar hoje...
A cadeira para a mesa: Pois, também eu não...
(Cinco minutos de silêncio)
A mesa para a cadeira: Como é que te chamas?
A cadeira para a mesa: Cadeira.
A mesa para a cadeira: Eu sou a mesa. Prazer.
A cadeira para a mesa: Será que ainda vêm hoje sentar-se?
A mesa para a cadeira: Quem sabe, cadeira, quem sabe...
(Horas de silêncio)

Carnaval

Falando sobre a lei de limitação dos cargos públicos, Alberto João Jardim disse:
"Quem vai decidir o momento de eu sair sou eu ou povo madeirense. Eu não deixo aquela gente (do continente) decidir sobre o futuro da Madeira."
Sem comentários.

É a América Um Estado Ocidental? IV

A pergunta “É a América um estado ocidental?” não é de todo despropositada. Pelo menos se nos referirmos à matriz original que moldou o Ocidente. Dizia Jean Baudrillard que “A América é a versão original da modernidade”, querendo dizer com isto que havia abolido o passado. Abolir o passado implica abolir o futuro, porque perde-se a perspectiva temporal que nos permite projectar no futuro, planificando-o. Vive-se numa perpétua actualidade. É também esta obliteração do tempo que impede aos EUA a compreensão da importância de um planeamento a longo prazo do desenvolvimento humano em termos ecológicos. O colapso ecológico é demasiado longínquo. Quinze minutos é a medida americana. E quinze minutos até são uma eternidade no zapping televisivo, que veio substituir a reflexão. Este Império é também o Império da Imagem. Por outro lado, os EUA não são um estado mas uma federação de estados que exercem um poder global de uma forma desterritorilizada, segundo a qual o poder se exerce não através da ocupação e posse do território, mas da implantação dos grandes consórcios económicos em locais estratégicos à volta do mundo. Neste sentido assistimos ao emergir de uma nova perplexidade: um império que não tem fronteiras e que se identifica em última instância com o globo. Este império tem dentro de si o fim do estado. É certamente também por este motivo que numa altura em que a Europa se volta para o multilateralismo nas relações entre estados como alicerce de um mundo futuro, o Império do Atlântico assume posturas unilaterais. De facto, não estamos longe do tempo em que o centro e a periferia coincidirão por força da hegemonia americana. E isto é a negação do universalismo.

sexta-feira, abril 15, 2005

Curiosidade - A Lei Das XII Tábuas

A Lei das XII Tábuas remonta à data provável de 450 a.c., e foi publicada em 12 tábuas de madeira. O seu texto não chegou íntegro até aos nossos dias - do seu conteúdo, é conhecida apenas uma terça parte. Trata-se de um dos documentos jurídicos mais preciosos da Antiguidade, não só para Roma, onde foi efectuada, mas também para todo o Ocidente.
A tábua III contém 6 leis, cuja polpa se pode resumir:
1. Nas dívidas de dinheiro confessadas em juízo e em todos os casos julgados judicialmente, a execução das mesmas só se podia iniciar após o prazo de 30 dias (prazo que tinha como finalidade permitir ao devedor conseguir a soma devida).
2. Depois deste prazo, o responsável era levado novamente a tribunal pelas mãos do credor.
3. Se o réu não cumprisse a sentença, ou ninguém surgisse perante o tribunal a defendê-lo ou afiançá-lo, então o magistrado adjudicava o devedor ao credor, i. é, o credor apoderava-se do réu e levava-o para sua casa. Aí, atava-o com correias ou grilhetas de um peso de 15 libras ou inferior. Tudo isto no intuito de forçá-lo a cumprir a dívida.
4. Ainda no cárcere privado do credor, se o devedor o desejasse, podia alimentar-se por conta do seu património. Caso não pudesse, quem o mantinha preso estava obrigado a dar-lhe 1 libra de farinha por dia ou mais.
5. Havia o direito de negociar e, caso não chegassem a acordo, então o vinculado mantinha-se preso à guarda do credor durante 60 dias. Dentro desse prazo, era levado a 3 feiras públicas seguidas e, perante o pretor, apregoava-se a quantia em que tinha sido condenado (e pela qual podia ser resgatado, na esperança de que alguém a satisfizesse e assim remisse o preso). Decorridas as três feiras, o devedor ou era reduzido a escravo do credor, ou era vendido como escravo ou
6. era morto e esquartejado (sobretudo se fossem vários os credores). Se estes cortassem do cadáver mais ou menos do que o devido, isso não era considerado fraude.
Dura lex, sed lex.
Bibliografia: Sebastião Cruz, Direito Romano, 1984, 4ª edição

Proteste!


Posted by Hello

Proteste!

Assine já a petição em a defesa do público.

É a América Um Estado Ocidental? III

Não nos podemos esquecer de que o Novo Mundo é filho do Velho Mundo. Todos nós somos herdeiros das matrizes judaico-cristã e greco-romana. E mesmo dentro a amálgama do melting-pot americano, era esta linha que originalmente o definia e não outra. Convém também lembrar que o fenómeno melting-pot nunca foi uma verdadeira fusão de culturas e de povos, porque o único modelo dominante foi sempre o ocidental e, por outro lado, esse fenómeno nem é de agora nem é exclusivamente americano porque toda a história da Europa e de cada uma das suas nações, é uma história de intercâmbios culturais, económicos e genéticos. Somos intimamente africanos, asiáticos, árabes, judeus, eslavos, para além de tudo o resto. Incorporámos na nossa cultura e no nosso código genético os contributos de um número indefinido de povos. O sucesso do ocidente sempre esteve na sua abertura. Sempre que nos encerramos sobre nós próprios tornamo-nos fracos e entramos em crise. Esta abertura, de resto decorre das nossas próprias raízes comuns e originais herdadas: dos gregos o compromisso com a Razão; dos romanos o Estado e o desenho da Europa; dos hebreus o amor ao livro e a consciência do Tempo; do cristianismo o humanismo universalista.

quinta-feira, abril 14, 2005

O Caracol E A Formiga Jacinto

O caracol ia lento, em marcha cadente e húmida. Esticava e encolhia, esticava e encolhia, e assim ia-se deslocando. Numa certa couve, onde prosseguia a sua marcha, um obstáculo: a formiga Jacinto.
Querem saber a história da formiga Jacinto? Eu conto-vos a história da formiga Jacinto.
A formiga Jacinto era uma formiga como outra qualquer, mas tinha um senão: tinha tido um mau dia. Muito mau. Decidiu então, rápida e aleatoriamente, infernizar o pobre caracol, pondo-se no seu caminho.
Pode sair do caminho para eu poder passar?
Não saio!
Por favor, seria desagradável ter de passar por cima de si.
Passe, caracol-duma-figa, pois passe!
(confiante de que não passaria).
O caracol assim o fez e passou.

É a América Um Estado Ocidental? II

De certo modo, também lhes devemos a consciência de uma identidade própria, a Identidade Europeia. Não sabemos lá muito bem o que somos enquanto União Europeia, sabemos no entanto que não somos americanos. À falta de uma definição interna e essencial, definimo-nos de uma forma externa e acidental, somos ocidentais que [ainda] não são americanos, somos o que resta. O anti-americanismo é, de resto, o único traço comum entre as massas do Velho Mundo. Para além das nossas inultrapassáveis divergências, convergimos numa censura contra a barbárie americana. Tal não é algo de negativo porque significa que o nosso instinto de sobrevivência ainda subsiste e poderá ainda significar que haverá afinidades muito mais profundas do que as que poderia parecer à primeira vista, as quais se revelam a partir do contraste com a América. Redescobrimos Europa através da América.

terça-feira, abril 12, 2005

É a América Um Estado Ocidental? I

“A América é uma Europa no exílio.”
Jorge Luis Borges

“Um novo Império, uma nova burrice.”
Nietzsche

Devemos muito aos EUA. Entre muito daquilo que já se sabe da história todos os povos fracos devem sempre alguma coisa aos povos fortes, nem que seja a sua própria segurança. Muitas vezes o potencial agressor e o providencial protector são o único e mesmo povo. Somos aliados dos americanos porque os tememos. Mas também os tememos porque somos seus aliados. A todo o momento, a economia de guerra norte-americana exige mercado. A guerra é a continuação da economia por outros meios. E esses outros meios – militares e tecnológicos - são monopólio do Império do Atlântico. Seja lá como for, sabemos que o nosso turbulento amigo manter-nos-á para sempre reféns da nossa eterna divida de gratidão. Afinal de contas eles resolveram-nos duas guerras fratricidas. Seremos cúmplices de todos as suas acções, nunca poderemos nos situar fora da história porque todas as guerras americanas são guerras da Europa. Até porque só existe um lado, o do Império. E não existe história fora do Império. O poder é, obviamente, este hard power, ou seja, o poder da força, mas é também o soft power (Joseph Nye), ou seja, a capacidade de uma nação de influenciar as outras pela sua ideologia, seu sistema de valores, sua cultura. Indiscutivelmente a América é também Império neste sentido.

Relatório de Fim-de-Semana


1. Santana despediu-se em grande, bradando aos quatro ventos a sua insuportável dôr de corno. Como é possível que o mesmo PPD-PSD que o adolou, adorou e amou, esteja agora ali, mesmo à sua frente, na cama com outro?! O nosso amigo parece ter esquecido que o poder é afrodisíaco e poder é coisa que jamais voltará a ter. Brindemos a isso!

2. O Bloco de Esquerda reuniu este fim-de-semana a sua juventude para discutir qualquer coisa. Provavelmente o de costume. Pois... o bloco já tem jota... isto parece um sintoma claro de que se estará a transformar num partido como outro qualquer. É por estas e por outras que sinto falta do saudoso Manuel Sérgio e do seu PSN.

domingo, abril 10, 2005

Deus Processado?

Deus, segundo fontes fidedignas, irá ser processado. Representantes legais de criancinhas de dois anos mortas à fome, uma destacada associação de leprosos, bem como assim a caveira com que se deparou Hamlet decidiram, em litisconsórcio, intentar uma acção junto do tribunal de primeira instância.
A causa de pedir é a violação do principio da igualdade, implicitamente plasmado na doutrina cristã, dada a reiteração e gravidade da conduta discriminatória perpretada por parte dos agentes divinos - conduta que, de uma forma sucessiva, tem afectado irremediavelmente direitos sujectivos dignos de tutela dos litisconsorciados.
Na sua fundamentação, o advogado das vítimas alega o facto de que Deus persiste na realização apenas esporádica de milagres, realização tão rara que não ultrapassa as centenas, não conferindo o mesmo tipo de assistência milagrosa aos queixosos que definham dia após noite - como supra referido, em ostensiva violação do princípio da igualdade.
Aguarda-se desenvolvimentos.

sábado, abril 09, 2005

"As Escolhas De Vasco Granja"

Ouve-se rumores espalhados por pessoas vindas do leste de que o saudoso Vasco Granja está de regresso. Conta-se que o mestre do desenho animado irá apresentar um novo programa, nos domingos à noite na SIC, alegadamente chamado "As Escolhas De Vasco Granja", logo após o seu périplo pelos países eslavos na condução dos novíssimos desenhos animados do criador polaco Tomasz Polanski, nos quais os divertidos personagens Papa-Cor-De-Rosa e Joe, O Índio têm feito grande sucesso.
A luta desenfreada pelas audiências está assim iniciada. "As Escolhas de Marcelo", ou "As Escolhas de Vasco Granja". Portugal estará dividido e a escolha não será fácil.

sexta-feira, abril 08, 2005

Uma Estória Exemplar

Há algum tempo um amigo teve a leviandade de concorrer a um concurso público para um lugar de técnico superior numa autarquia. Na verdade, nem chegou a concorrer, desistindo numa fase muito precoce. Porquê? Porque consultando a lista dos candidatos admitidos a concurso juntamente com familiares viu-se no meio de uma conversa que desejaria nunca ter tido: « Esse? É filho de R. Mas não faz mal porque é do PS e a câmara é PSD.». «E este? O lugar é capaz de ser para ele. Ele andou lá pelas jotas...». «Olha, esta acabou agora mesmo o curso e é sobrinha do vereador X. Se calhar foi feito a pensar nela...»
O meu amigo meteu férias da família e de Portugal. E Jura que nenhum de nós merece isto. Precisávamos de uma valente desinfestação.

Lapso Compreensível

Celeste Cardona, ex-Ministra da Justiça, há tempos, disse inspirada: "mandato de captura".
O mandato é um negócio jurídico regulado no Código Civil, no artigo 1157º: "Mandato é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra." Algo bem diferente de um mandado.
Quanto ao mais, Celeste Cardona é licenciada em Direito.

quinta-feira, abril 07, 2005

Argumento Reversível

O meu amigo Pedro Nuno utilizou um excelente argumento para demonstrar a impossibilidade da existência de deus, ou pelo menos de um número mensurável de deuses. No entanto, convém chamar a atenção para o facto de se tratar de um argumento reversível. Aristóteles e toda a tradição escolástica posterior também sentiram a vertigem do infinito, que é a vertigem da irracionalidade. Aristóteles fala-nos de um "primeiro motor imóvel" como o responsável pelo despoletar de toda a dinâmica universal. Ou olhando para a longa série de causas e efeitos, vê-se na necessidade de propor uma "causa incausada" original. O que torna belo este tipo de argumento é o facto de surgir como uma espécie de resposta instintiva ao horror do infinito, mas recorrendo a uma solução elegantemente racional. O argumento é belo, mas não convicente.

quarta-feira, abril 06, 2005

Em Memória Do Sr. Silva

O Papa, Deus na Terra, morreu. Rainier III, Príncipe do Mónaco, morreu.
Mas esta semana morreu mais alguém. O sr. Silva (nome fictício) era um homem humilde. Quem o conheceu, afirma jurando ter-se tratado de uma pessoa ímpar. Sempre pronto a ajudar os amigos da aldeia, doava tudo o que podia - por vezes, o que não podia - aos pobres. Fazia voluntariado, prestando assistência a idosos. Adorava os animais, havendo sempre lugar para mais um cão na sua modesta casa. O Justo teria sido o seu cognome acaso tivesse sido rei.
O sr. Silva morreu ontem pelas 23:30. Não houve milhões de anónimos no choro discreto da sua morte. Não houve massa humana a encher as ruas em redor do cortejo fúnebre. Não houve repórteres do mundo inteiro. Houve apenas vinte e uma pessoas no seu enterro, que trarão para sempre consigo a sua memória.

D. Policarpo e o Aborto

D. José Policarpo afirmou que o aborto, mesmo legal, é uma questão moral. Creio que acabámos de ganhar um apoiante inesperado à causa da liberalização do aborto. O que D. Policarpo afirma é, implicitamente, o reconhecimento de que a decisão de abortar ou não abortar é apenas uma questão moral. De resto, todo e qualquer tipo de decisão, por exigir uma tomada de posição, é sempre uma questão de moral.
Espero que o nosso "papabili" nos conceda apenas dois outros pontos para arrumarmos de vez esta questão: 1.º Não é da competência do estado definir a moralidade; 2.º A igreja católica não tem o monopólio da moralidade.

terça-feira, abril 05, 2005

Centro e Periferia

Um dia destes ao ver Sócrates na televisão revi-me naquele personagem de Nanni Moretti no Aprile ou no Caro Diário (ou até noutro filme, não estou bem certo) que implorava frente ao televisor: «Diz qualquer coisa de esquerda! Por favor! Diz qualquer coisa de esquerda!» (citação não textual). Mas o nosso Sócrates nada nos diz de esquerda. Causa: a esquerda morreu! A direita também! A política morreu!
Bom... Talvez o anúncio da morte da política seja manifestamente exagerado. Mas o que é certo é que já não vale a pena sentar meticulosamente os nossos deputados da esquerda para a direita. Já não se arruma assim a casa! Agora é tudo centro! Como quem diz: ninguém sabe ao certo o que é e, portanto, onde se sentar. Para se fazer justiça a esta situação proponho que a partir de agora as cadeiras do parlamento sejam substituídas por um carrossel.
Os dois grandes partidos estão engalfinhados um no outro, tornando-se às vezes muito complicado distinguir onde começa um e acaba outro. O que os move é apenas uma força agonística sem sentido, que os faz rodar no vazio um sobre o outro, num movimento perpétuo mas aparente porque não avançam nem recuam. À volta dos partidos do centro gravitam os pequenos partidos periféricos que retiram a sua dinâmica da força gravitacional dos partidos do centro. Também não vão a lado algum porque não dependem de si próprios, a sua natureza é parasitária. De uma forma mais ou menos sistemática vão lançando farpas contra o centro, mas com um cuidado esmerado, não vá o mecanismo avariar e criar-se uma crise como, sei lá!, uma mudança a sério ou qualquer coisa assim.
Voltando ao Nanni Moretti frente à televisão. Estão a vê-lo a implorar: «Diz qualquer coisa de periférico! Por favor! Diz qualquer coisa de periférico!»? Eu não. Mas vejo-o a desligar a televisão e sair de casa para comprar um gelado de morango.

Há Mais Deuses Por Aí Do Que Se Pensa

A vida não pode ter vindo do nada - frase que ouço insistentemente, com uma referência implícita a Deus. Bom. A ser verdadeira, esta asserção importa consequências.
1. Se a vida não pode ter vindo do nada;
2. Se somos criação de Deus porque a vida não pode ter vindo do nada;
3. Se Deus é um ser vivo porque é ser e é vivo (seja em carne ou em espírito, pouco importa);
então pergunta-se: e Deus, veio do quê? Se Deus é vivo e a vida não veio do nada, só poderemos concluir que houve outro Deus criador desse Deus. E este último? Acaso terá vindo do nada? Não, certamente. Houve decerto ainda outro Deus que criou aquele último. E assim por diante, ad eternum. É por isso que há mais Deuses por aí do que se pensa.
Mas basta. Talvez ocupe demasiadamente o meu tempo com questões como esta. Talvez deva ser mais exigente comigo próprio e embrenhar-me por questões mais prosaicas, mas por certo mais difíceis e estimulantes. Como por exemplo, saber quem é mais feio - se o Príncipe Carlos, se Camilla Parker Bowles.

Polacadas

Os polacos exigem a urgente beatificação de João Paulo II. Quem faz santos torna-se, ele próprio, num santo. É caso para dizer: é preciso ter muito cuidado com o que se faz. Eu, como nada faço, em nada me transformarei. O que é bem merecido.

segunda-feira, abril 04, 2005

Papadas

Não resisto à força da maré e, por isso, também tenho uma opinião sobre o Papa para quem a apanhar. Bom, na verdade a noite é fecunda e em vez de uma, tenho três:
1. Sou agnóstico metódico (não sei se Deus existe, nem quero saber e esforço-me ao máximo para me manter nesta deleitosa ignorância), mas acredito nos homens. Do ponto de vista humano o Papa foi demasiado humano. Existem atitudes que tolero no taxista que me traz de volta a casa ou no meu barbeiro que com a sabedoria das gerações adia a revelação da minha calvície precoce, mas que me proíbo de tolerar num dirigente mundial. A condenação do uso do preservativo, do aborto, o desprezo pelos homossexuais e mulheres e a perseguição estalinista aos desvios do dogma oficial, é tudo demasiado sórdido para quem tem o poder de fazer beatos e santos;
2. O aproveitamento mediático sabiamente alimentado pela cúpula do Vaticano teve qualquer coisa de hipócrita. O sofrimento de um homem não é um instrumento de evangelização, mas um atentado à dignidade da pessoa humana. As estratégias de vitimização e de mortificação apenas produzem morbidez, que é uma afectação da alma demasiada rasteira para ser confundida com a fé.
3. Morreu um homem. Apenas isso.

Etiquetas:

sábado, abril 02, 2005

Carta Aberta Aos Assassinos Da Língua Portuguesa

Poix é. Nu funduh de cda poço há smpre a extória d kem lá kaíu. Kem as conxeg deskubrir?
Mas que é isto? Das duas, uma: ou os doutos vilipendiadores da palavra pretendem abreviar os seus escritos (compreensivelmente, dada a dinâmica e rapidez exigidas no diálogo processado via internet, ou mesmo dada a falta do espaço necessário para se enviar uma mensagem escrita no telemóvel), ou então é tudo uma questão de uso deliberado do seu poder criativo para esquartejar o português.
Se se trata da primeira hipótese, tais meios para tal fim são movidos debalde. Pois escrever poix, funduh, kaíu, deskubrir não é mais rápido (por vezes muito pelo contrário) nem poupa mais espaço no ecrã do telemóvel do que escrever pois, fundo, caíu, descobrir.
Como dramaticamente me apercebo de que as mais das vezes se trata, sim, da segunda hipótese, resta-me resistir e tomar calmantes para os nervos.

Fio Da Lâmina

Pela minha parte, não acredito no determinismo do calendário. Há dias e dias e em cada um deles a absoluta mentira e a absoluta verdade se confundem (o Papa morreu! o Papa vive! são duas verdades, não são?). A mim interessa-me esta linha finíssima entre uma e outra. Prometo uma marcha sobre a lâmina.

sexta-feira, abril 01, 2005

O Caminho

Ainda não sei bem o que fazer deste blog. Aos poucos irá ganhando forma.

Dolo Eventual

Surge em 1 de Abril de 2005. Se dia 1 de Abril é o dia das mentiras, por maioria de razão todos os outros hão-de ser dias das verdades. É nestes que hei-de escrever.