Dolo Eventual

David Afonso
[Porto]
Pedro Santos Cardoso
[Aveiro/Viseu]
José Raposo
[Lisboa]
Graça Bandola Cardoso
[Aveiro]


Se a realização de uma tempestade for por nós representada como consequência possí­vel dos nossos textos,
conformar-nos-emos com aquela realização.


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domingo, julho 31, 2005

O Livro de Reclamações de Domingo: TV Nos Comedores

Creio que já tinha dito isto aqui: sou um cliente demasiado assíduo de restaurantes. Como não tenho dinheiro para frequentar os restaurantes que gostaria, tenho-me de ficar por casas mais modestas. O que às vezes até me permite fazer achados geniais (Aaahh! O Bacalhau de Cebolada do Melo, o Bife do Triunfante, as Tripas da Adega do Olho, a Cabidela daquela tasquinha à Cordoaria,...), mas não é disso de que vos venho falar. Esta rubrica é só para reclamações! Hoje vou vociferar contra a invasão dos televisores nos comedores! Caramba! Mas alguém consegue prestar a devida vénia a uns Rojões à Minhota com o Jorge Gabriel a lambuzar os desgraçados dos velhotes? Ou mastigar com a dedicação merecida uns Pézinhos de Coentrada com Luís Goucha ao telefone com um luso-descendente de Toronto? Ou venerar o aroma de umas divinas Papas de Sarrabulho com a Moura Guedes a anunciar o fim-do-mundo? Ou rechaçar uma bela Francesinha com o Gabriel Alves a comentar um jogo do Benfica? Eu não! Desliguem-me a merda da televisão.

Dolo Eventual Memória

«Em Memória Do Sr. Silva», é o título deste post por mim escrito no dia 6 de Abril de 2005:
O Papa, Deus na Terra, morreu. Rainier III, Príncipe do Mónaco, morreu.
Mas esta semana morreu mais alguém. O sr. Silva (nome fictício) era um homem humilde. Quem o conheceu, afirma jurando ter-se tratado de uma pessoa ímpar. Sempre pronto a ajudar os amigos da aldeia, doava tudo o que podia - por vezes, o que não podia - aos pobres. Fazia voluntariado, prestando assistência a idosos. Adorava os animais, havendo sempre lugar para mais um cão na sua modesta casa. O Justo teria sido o seu cognome acaso tivesse sido rei.
O sr. Silva morreu ontem pelas 23:30. Não houve milhões de anónimos no choro discreto da sua morte. Não houve massa humana a encher as ruas em redor do cortejo fúnebre. Não houve repórteres do mundo inteiro. Houve apenas vinte e uma pessoas no seu enterro, que trarão para sempre consigo a sua memória.

Relatório

1. Foi descoberto mais um planeta no sistema solar, o décimo. Está a 14,5 mil milhões de quilómetros do Sol. Este planeta, baptizado de 2003-UB313, é maior que Plutão.
2. «Conto com esta juventude de Portugal para dar a volta nisto, porque, tal como está, o país não é uma democracia. Isto é um sistema corporativo que nos está a arrastar a todos cada vez mais para circunstâncias piores», disse João Jardim. Eu também conto com a juventude da Madeira, mas para não votar em Alberto João Jardim.
3. Já cheira a campeonato de futebol. Vai começar outra vez a discussão de sempre: «Foi falta ou não foi falta?» «Estava fora de jogo ou não estava fora de jogo?» «Foi bola na mão ou mão na bola?». E tudo vai voltar a ser como era dantes.

sábado, julho 30, 2005

O Dolo Eventual Em Foto Reportagem




Estas fotos foram tiradas na passada 5ª-feira, na baixa do Porto. Os comerciantes do Bolhão protestam em marcha lenta contra a prepotência do Dr. Rui Rio. Toda esta boa gente tem um ar desorientado, caminham para esgotar a revolta. Apesar de não se ver nas fotos, acredito que o presidente da CMPorto também se sinta desorientado...

Rui Rio: O Anti-Midas

Ao contrário do lendário Rei Midas, que transformava em ouro tudo em que tocava, Rui Rio parece ter o misterioso condão de transformar em problema tudo em que toca. Túnel de Ceuta, Avenida dos Aliados, El Corte Inglès, Metro na Boavista e agora Mercado do Bolhão. Há ainda quem gabe a coragem política do Presidente da Câmara ao afrontar desta maneira os comerciantes do Bolhão. Eu, pela minha parte, não confundo coragem com inconsciência. Existem óbvias condicionantes de segurança que representam um perigo para os próprios comerciantes e clientes, às quais a autarquia enquanto proprietária e entidade responsável não poderia ficar indiferente. O que ninguém consegue compreender é esta forma abrupta e prepotente de abordar o problema! Ninguém compreende como é que a Câmara deixou o imóvel se degradar daquela maneira, sem fazer as obras de manutenção a que a lei obriga, e vem agora exigir que os comerciantes libertem o espaço em tempo recorde. Para piorar a situação Rui Rio em vez de acalmar as pessoas, resolve, qual Nero, atiçar ainda mais o fogo: comete a imprudência de declarar que nem todos os comerciantes vão poder voltar ao Bolhão depois das obras e, à socapa, durante a noite, interdita parte do Mercado! O resultado só poderia ser a revolta.
Para aqueles que dizem que o Bolhão morreu e que no seu lugar devia nascer uma espécie de centro comercial, ou um mercado snob e de recuerdos para turista ver e comprar, talvez fosse bom visitarem a um Sábado, pelo menos uma vez na vida, o mercado. Eu, apesar de morar mais perto do Bom Sucesso, prefiro apanhar o metro para o Bolhão, onde compro fruta e legumes que não consigo encontrar nas grandes superfícies, aproveito para me abastecer de várias variedades de azeitonas e de ervas aromáticas e, às vezes, quando vale a pena, compro algum peixe. Aproveito ainda para fazer algumas compras de mercearia fina nas mercearias que situam por ali à volta. Depois é só apanhar o metro de volta a casa. É claro que o Bolhão está decadente, é claro que tem problemas de higiene e de acondicionamento dos produtos, é claro que tem espaços desocupados, mas não morreu ainda! Todas as cidades europeias que conheço têm mercados de frescos: são mais arrumados, mais acolhedores, com oferta mais variada que o Bolhão, mas não tão bonitos e animados como o Bolhão. Há muito a melhorar: trazer mais comerciantes, variar ainda mais a oferta (uma loja de vinho era, de facto, excelente ideia, tal como outra de produtos africanos, ucranianos e outros, e claro, produtos biológicos), adaptar os horários às actuais exigências. E tudo isto é compatível com a manutenção dos actuais comerciantes, que merecem todo o nosso respeito e solidariedade.
(Foto da manifestação dos comerciantes do Bolhão no passado dia 28 de Julho frente aos Paços do Concelho)

O Comércio do Porto (02 de Lunho de 1854 - 30 de Julho de 2005) RIP

É o fim. Aproveite hoje para comprar o último «O Comércio do Porto». Afinal de contas não é todos os dias que morre um jornal com mais de 150 anos! Talvez um dia o Porto volte a ser grande.

Nem Sempre O Investimento Gera Riqueza

Afinal parece que o investimento não gerou riqueza. Os milhões que os portugueses investiram em boletins de euromilhões foram ralo abaixo. Mais uma vez, quem nos ganha é a Irlanda, que leva o prémio. Eu, parece, pelo menos ganhei 9,26€.

sexta-feira, julho 29, 2005

O Casaco de Nuno Portas

Na passada 4ª feira vi no Canal 2 uma entrevista ao admirável Nuno Portas. A dado momento, para ilustrar os limites da actividade do urbanista, o arquitecto usou uma imagem bastante ilustrativa: os planos de urbanismo são como os casacos, ou seja, não é por fazer um casaco pequeno que as pessoas vão emagrecer, quanto muito ficam apertadas. Fiquei a cismar naquilo. Pedi uma opinião feminina: recebi um impressionante relatório sobre a falcatrua da Zara que é a de todos os números serem dois pontos abaixo do normal e que em Espanha os nutricionistas, pais e educadores têm vindo exigir que as lojas de roupa vendam números normais e não apenas versões minúsculas, porque estas condicionariam as adolescentes, levando-as a dietas irracionais, as quais, em última instância, descambariam em anorexia. Afinal de contas, um casaco pode tornar uma pessoa mais magra, fatalmente magra. Se isto é verdade para os casacos, também deverá ser verdade para as cidades. E é desta maneira que se reescrevem os anais da epistemologia do urbanismo.

Leituras

«O senhor Valéry não era bonito. Mas também não era feio.
Há muito tempo atrás havia decidido trocar os espelhos por quadros de paisagens. Desconhecia, pois, o seu aspecto exterior actual.
O senhor Valéry dizia:
- É preferível assim.
E explicava:
- Se me visse bonito ficaria com medo de perder a beleza; e se me visse feio ficaria com ódio às coisas belas. Assim, não tenho medo nem ódio.»
(...)
Gonçalo M. Tavares - O Senhor Valéry - Lisboa: Editorial Caminho 2002

quinta-feira, julho 28, 2005

O Que Pensa O PS Do Socialismo Ou Os Grandes Mestres Das Artes Marciais

«O governo prepara-se para aprovar o congelamento das carreiras da função pública. O PS pensa que ser socialista é ser sócio de alguma coisa. O dr. Jorge Coelho disse uma vez que quem se mete com o PS leva; e eu digo-lhe que quem se mete com a Função Pública leva.»
Espectador José Gonçalves, via telefone - Opinião Pública, SIC Notícias

A Ministra E A Professora De Química

«Contavam-me agora, que uma professora de Química, num programa da RTP, não sabia o que era um ângulo recto.»
Se tudo se ficasse por aí... O pior é que a própria ministra pensa que as decisões de um tribunal dos Açores não vinculam a República Portuguesa!
Jornalista: «O que entende por princípio da unidade do estado?» Ministra: «Efectivamente... o... prin... [virando-se para a sua secretária, que lhe havia sido emprestada por Sócrates] sabe o que é isso?» Jornalista: «Mas vai-me responder ou não?» Ministra: «Desculpe, não me quero pronunciar sobre essa matéria. Tenho agora mesmo uma reunião importantíssima com uma professora de Química e estou atrasada, sim? Tenha um bom dia.»

quarta-feira, julho 27, 2005

De Táxi Até Ao Fim-do-Mundo Com A CP

No Público de 25 de Julho:

«Alterações de horário levam CP a transportar passageiros de táxi»
«Clientes da CP foram transportados de táxi de Lisboa para Castelo Branco e para Faro devido a alterações de horários que anteciparam a saída de alguns comboios.»

Como é possível? A resposta:

«Esta situação é consequência da segmentação dos serviços a cargo de várias unidades de negócios que, aparentemente, não comunicam eficazmente entre si. Cada unidade (CP-Lisboa, CP-Porto, CP-Longo Curso, CP-Regionais) define os seus próprios horários sem os articular com a oferta global da empresa, perdendo-se o efeito de rede que caracteriza o caminho-de-ferro na maioria dos países europeus.»

Mas isto faz sentido para alguém? Será possível que uma empresa pública possa ser tão mal administrada? Será que não haverá aqui dedo de um agente infiltrado da BRISA?
Uma vez vi-me surpreendido com a situação bizarra de ao tentar apanhar um comboio, a CP me ter disponibilizado em sua substituição um autocarro. Agora corro o risco de ao apanhar um táxi para estação, esse mesmo táxi me levar até Faro! É claro que a coisa assim nunca dará lucro! E depois esta coisa de recortar a linha em pedacinhos não lembrava nem ao diabo! Por exemplo: faz algum sentido que um cliente munido de um bilhete Coimbra-Porto tenha de trocar de comboio em Aveiro? Pois bem, para a CP faz. Bom, uma coisa é certa: este é um contributo muito importante para o engrandecimento do país. Como podemos nós ser um país pequeno quando temos tantas companhias (ou “unidades de negócio”) de caminho-de-ferro? Quando percorrer de lés-a-lés o nosso território temos de saltar de composição em composição? O país medido pela bitola da CP é do tamanho da Sibéria! E ameaça não parar de crescer!
PS: proponho à CP um novo produto: Inter-Rail de Táxi!

Leituras

«O senhor Valéry tinha um animal doméstico, mas nunca ninguém o tinha visto.
O senhor Valéry deixava o animal fechado numa caixa e nunca o tirava para o exterior. Atirava-lhe comida por um buraco da parte de cima da caixa e limpava-lhe as porcarias por um buraco da parte de baixo da caixa.
O senhor Valéry explicava:

- É melhor evitar os afectos por animais domésticos, eles morrem muito, e depois é uma tristeza para o coração.»
(...)
Gonçalo M. Tavares - O Senhor Valéry - Lisboa: Editorial Caminho 2002

terça-feira, julho 26, 2005

Pulseira Pulrai

Há pouco fui ao registo civil e a senhora que me atendeu tinha uma daquelas pulseiras douradas que têm duas esferas nas extremidades, que alegadamente fazem bem aos rins, à circulação, aos nervos, enfim - fazem bem à saúde. Melhor: não fazem mal. Há anos que não via ninguém com uma pulseira dessas, o que me fez recordar da minha mais tenra infância - de quando António Sala [penso que era ele que anunciava e promovia na televisão as milagrosas pulseiras], com aquele bigode de quem bebe cerveja preta, me entrava sala adentro e falava das miríficas qualidades da pulseira Pulrai. Sim, penso que era Pulrai que se chamava. Devia ter uns seis anos. O tempo passa...

Durão Barroso Na Comissão Europeia

Financial Times
Nota: para aceder à notícia, procurei no search & quotes. Primeiro escrevi Durão Barroso. Nada. Quando escrevi José Barroso, a notícia apareceu imediatamente.

Comunicado Aos Anónimos

O Dolo Eventual sempre se pautou pela promoção da participação activa dos seus leitores, ainda - e principalmente - quando tal participação surja em tom discordante. Prova disso mesmo é o facto de neste blogue sempre ter sido permitido o comentário. Por outro lado, a partir de hoje, o Dolo Eventual passará a aceitar textos dos seus leitores para publicação. Só que, se dermos um passeio por um qualquer dicionário de português, verificamos que discordância [falta de acordo; divergência; dissonância] não tem o mesmo significado que insulto [injúria; ofensa; ultraje; agressão]. E, curiosamente, quem insulta as mais das vezes não tem nome, não tem face, não tem rosto - é anónimo. Queremos dar um nome a essa gente que não consta do registo civil. Assim, no Dolo Eventual, ora em diante (e como foi já referido pelo David, no seu post Marina da Barra III, no qual respondia a um anónimo exaltado), não serão permitidos comentários anónimos, por forma a desencorajar o insulto sem rosto.

O Efeito Queixa

«No seu artigo no Público da semana passada, Mário Pinto sugere que as escolas privadas deveriam fazer queixa contra o Estado por "concorrência desleal", por causa de este financiar as escolas públicas e não aquelas. Pela mesma ordem de ideias, as clínicas privadas deveriam fazer idêntica queixa, por causa de o Estado só financiar os hospitais públicos; e as companhias de segurança privadas deveriam também queixar-se da polícia; e os anarquistas e libertários da concorrência desleal do Estado...»
Vital Moreira, Público

Os Fins Das Penas

Disse David Afonso, no seu post Sexo Na América: «Para a nossa sensibilidade europeia uma pena de trinta anos por causa de um acto sexual com um menor (?) de 14 anos é manifestamente desproporcionado.»
Esta frase leva-nos à questão dos fins das penas. Há neste campo essencialmente duas grandes teorias: as teorias absolutas e as teorias relativas.
As primeiras vêm a pena como retribuição ou compensação do mal do crime; compensação essa que é função da culpa do agente. Estas teorias estão, entre nós, ultrapassadas porque: 1º) nestas teorias, a pena não oferece à sociedade qualquer efeito útil (e, por esta via, não se trata verdadeiramente de teorias dos fins das penas) - há apenas um tanto por tanto normativo [a tua culpa foi esta, pagas isto]; assim, a pena esgota-se na expiação do prejuízo do crime, não lhe restando qualquer sentido positivo; 2) o Estado de direito democrático laico não é uma entidade que esteja legitimada para exercer «vingança» ou uma qualquer «justiça vingadora ou vingativa», ainda que esta seja comummente considerada uma justiça ideal, divina. Cumpre-lhe apenas a tarefa de protecção subsidiária de bens jurídicos, e sempre na estrita medida do necessário (princípio da proibição do excesso). Para cumprir tal tarefa, necessita de conferir sentido social-positivo à pena.
Já as teorias relativas encontram na prevenção criminal o seu sustento. Não obstante reconhecerem existir uma compensação do mal do crime na aplicação de uma pena, entendem que é preciso ir mais além para conferir a necessária legitimação ao Estado para a aplicação de sanções jurídico-penais: é preciso atribuir às penas verdadeiros fins ou sentidos social-positivos. Assim, estas poderão ter um sentido de prevenção geral (reforçando ou restabelecendo, com a efectiva aplicação das sanções penais, a confiança da comunidade na validade e vigência da norma desrespeitada), e um sentido de prevenção especial (de reinserção social ou socialização, dando ao agente as condições para que no futuro não venha a praticar crimes).
Para que o Estado leve a boa foz a sua tarefa de protecção de bens jurídicos e, por aqui, da criação de condições para a existência da mais livre realização da pessoa humana, é necessário que os fins das penas tenham apenas natureza preventiva, repudiando quaisquer concepções retributivas - por mais que seja essa a ideia do senso comum - esvaziadas de conteúdo finalístico e quase próximas de uma justiça ideal ou divina - justiça essa que os Homens não estão nem nunca estiveram habilitados a realizar. São aqueles fins preventivos os consagrados pelo ordenamento jurídico-penal português, como se pode verificar no artigo 40.º do Código Penal.
Não conheço a lei estadunidense, confesso. Mas não foi com grande surpresa que li no jornal (e admitindo que não se trata aqui de algum concurso de crimes) que os actos [sexuais com um menor de 14 anos] da jovem [e, por sinal, muito bonita] professora de 24 anos tinham uma moldura penal que poderia atingir os trinta anos. E não foi com grande surpresa porque a notícia vem de uma nação que admite a pena de morte e que estende a tutela penal a actos que não violam bens jurídicos (e sim uma qualquer «moral pública» - talqualmente o fazem muitos estados islâmicos), como por exemplo, como escreveu o David no post supra referido, a proibição da prática, em certos Estados, de sexo anal. Em Portugal, uma pena de trinta anos de prisão pela prática de actos sexuais com um menor de 14 anos, a querer ser instituída por algum projecto ou proposta de lei mais populista, nunca passaria o princípio da proibição do excesso ou da proporcionalidade em sentido amplo. Segundo este princípio, constitucionalmente tatuado no art.º 18/2 da CRP, qualquer restrição por lei aos direitos, liberdades e garantias deve limitar-se ao necessário (tem de haver aqui um juízo de adequação, necessidade e proporcionalidade) para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos. Por outro lado, uma pena de 30 anos de prisão a uma jovem de 24 anos falha em absoluto e por completo qualquer tentativa de ressocialização ou reinserção social - pelo contrário, após cumprir a pena, sairá em liberdade doutorada na escola do crime, sem quaisquer perspectivas. São trinta anos! Trinta anos não ressocializam - marginalizam. Quanto ao reforço da confiança da comunidade na validade e vigência da norma violada, exclamo mais uma vez: trinta anos?! É uma marca que excede qualquer limite. Assim, só posso concluir que se trata de uma pena com um fim retributivo. O que é de lamentar.

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segunda-feira, julho 25, 2005

O Livro de Reclamações de Domingo (mais uma vez atrasado e em versão mini): minis?

E minis? Meu Deus! Como é difícil beber uma mini nesta cidade!

Estamos A Pensar Em Entrar No Séc. XXI

domingo, julho 24, 2005

Marina da Barra III

A) O Preâmbulo:
A propósito do post Marina da Barra fomos recebendo vários comentários quer no próprio blog, quer no nosso mail. Como é natural nestas coisas, o post não gerou qualquer unanimidade, até porque tal nem era suposto acontecer. Uns concordaram outros nem por isso. O que é certo é que vários blogues deram algum relevo ao assunto e, entre eles, o blogue de João Oliveira – Notas Entre Aveiro e Lisboa – no qual um anónimo fez um comentário muito crítico ao post publicado no Dolo Eventual. Normalmente não me daria ao trabalho de responder a alguém que se esconde no anonimato, mas duas razões obrigam-me a tal: 1º) o tom e o teor do comentário são inaceitáveis; 2º) eu próprio havia usado um comentário de um leitor que também não se identificou e que partilhava o meu ponto de vista e, nesta situação, não seria coerente da minha parte desvalorizar um comentário não assinado só porque não me era favorável. Seja lá como for, a política editorial do Dolo Eventual passará, no futuro, por não permitir comentários anónimos de maneira a desencorajar o insulto gratuito e a insinuação cobarde. Fica então aqui, pela primeira e última vez, a resposta a um ilustre desconhecido.

B) O Comentário Anónimo:
«Lamento que um blog como aquele que muitos vem lendo com algum agrado, embora não sempre em concordância, faça eco dum artigo de um pretenso ecologista que, pelos vistos, emparelhou com aqueles que cometeram o maior crime socio, económico ambiental da nossa região que foi impedir a construção da Marina da Barra, escudados em pretensos e mentirosos argumentos ambientais (de um ambiente a que na sua concepção o homem -o horrível e eterno predador- não deve nem pode pertencer) e mal intencionados e nojentos comentarios (ver financiado por BPN - o dinheiro deveria ser das irmãzinhas da caridade?. Ílhavo e a região de Aveiro ficaram, graças à acção deste e doutros senhores encabeçados pelo invejoso dr. Souto privadas de um pólo de desenvolvimento sócio-económico e ambiental dinamizador de toda a recuperação da Ria de Aveiro que, actualmente (e dada a situação económica que vivemos e viveremos no futuro) já não vai ser possível retomar. Algumas perguntas ficam:1- Qual é mais gravosa do ponto de vista ambiental? A marina da Barra ou a Pista do Rio Novo do Príncipe? Ou o campo de Golfe de Aveiro?2- Porque é que quando os estudos de impacto ambiental são encomendados e pagos ao IDAD da Universidade de Aveiro (leia-se dr. Borrego) são sempre aprovados e quando se encomendam os estudos a outras empresas são quase sempre chumbados e o dr. borrego aparece publicamente a falar contra o projecto - e neste caso até a escrever pessoalmente ao próprio ministro. Podemos saber quanto tem usufruido o dito prof. do IDAD (além do seu ordenado de prof.)? 3- Quem apoia financeiramente as pretensas organizações ecologistas e que interessesmovimentam? 4- Parece que o único bom projecto ultimamente feito em Aveiro foi o Estádio, executado à custa dos nossos bolsos e dos bolsos dos nossos filhos. A iniciativa privada ou as parcerias privado-público são criminosas? 4- Estes indivíduos conseguiram que se não fizesse a Marina da Barra e impediram a recuperação de parte da Ria de Aveiro. São bons a liquidar projectos. Mas o que é que já fizearm em alternativa para salvar a Ria? Quais os seus projectos? Mais especificamente que pretendem fazer aquela zona artificial em vias de eutrofização onde era para ser feita a marina da Barra. Deixar ficar como está? Deixa morrer?»

C) A Resposta:
Antes demais lhe devo confessar que sinto alguma dificuldade em me dirigir a alguém sem rosto e sem nome, por isso vou ter de dar um nome postiço. Artur deve servir. A partir de agora o meu caro amigo já não é um anónimo, mas o Artur. Agora que foi ultrapassada esta dificuldade inicial, vamos então ao que interessa:

Caro Artur,

a) Não sou, de facto, um ecologista. Pelo menos se entendermos por ecologista um activista membro de qualquer ONG vocacionada para a defesa do meio ambiente. Na verdade, sou apenas um cidadão e, como tal, exerci o direito de livre expressão, dando a minha opinião da forma o mais fundamentada possível sobre um tema que me diz muito. Talvez não habituado à regra do jogo da democracia, o Artur acha-me um criminoso só porque as nossas opiniões são opostas.

b) Sobre o BPN não se percebe como viu no meu artigo «mal intencionados e nojentos comentarios»! Vá lá, Artur tenha lá a santa paciência e releia o texto. Se o fizer verá que o que lá está escrito é isto: «O que se passa é que houve uma decisão política, confortada por pareceres técnicos superiores, que contrariou as expectativas irrealistas da Sociedade de Desenvolvimento e Exploração da Marina da Barra de Aveiro (na qual o BPN tem uma posição importante).» Como vê, limitei-me a prestar uma informação, sem qualquer juízo de valor. Mas, por motivos que só o próprio Artur saberá, esta informação por si só parece ter um carácter sumamente ofensivo.

c) Quanto à inveja que imputa a Alberto Souto, presidente da CM de Aveiro, devo-lhe dizer que esse tipo conversa é do mais provinciana que existe. Não sendo particular admirador desta personagem (creio até que Aveiro regrediu em alguns aspectos nos últimos 4 anos), não posso, no entanto, de deixar de concordar com a sua postura neste processo. E não me venha cá com essas guerrinhas, porque este problema não diz respeito apenas ao Concelho de Ílhavo. Para tornar mais claras as coisas, acrescento um dado que, para si, poderá ser uma surpresa: sou da Gafanha da Nazaré, logo seria um daqueles que, na sua óptica, mais iria beneficiar com o projecto da Marina, mas – oh surpresas das surpresas – não pedi e nem quero a dita Marina!

d) Outra coisa em que não alinho é nessa de que a Marina da Barra seria um pólo de desenvolvimento sócio-económico. Pessoalmente, não me parece que o desenvolvimento do país se faça à custa de marinas e outros investimentos imobiliários. Não me revejo na visão de Portugal de Ribau Esteves, que um dia disse: «É preciso que o eterno discurso dos políticos portugueses passe à prática e se materialize em várias marinas da Barra pelo país». A fixação que temos na construção é uma patologia social, cultural e cultural endémica. Com a agravante de que gravitam em torno do negócio imobiliário interesses que estabelecem entre si relações de simbiose perniciosas para a saúde económica e política da nossa democracia. A relação entre a banca, os promotores imobiliários e a política já demonstrou demasiadas vezes ser pouco clara e perigosa (veja-se, por exemplo, o caso BES/CDS/Companhia da Lezírias). Em vez de investirmos no betão, seria já altura de começarmos a investir a sério na I&D. Talvez não saiba, mas investimos apenas 0,79% do PIB em I&D, ao passo que a Suécia investe 4,27%, a Finlândia 3,49% e até a Rep. Checa 1,26%! Competimos com a Grécia 0,61% e Chipre 0,32%, que devem ter excelentes Marinas! O problema é que este tipo de investimento não permite o financiamento dos partidos.

e) Quanto às perguntas que fez ficam aqui as respostas possíveis:
1) Amigo Artur, vai-me desculpar, mas como chegámos até aqui já me sinto à vontade para lhe falar assim deste modo tão franco: a sua pergunta, que pretende ser um argumento, é imbecil. Sim, imbecil porque se procura demonstrar a bondade da construção da Marina, o máximo que consegue é reforçar a argumentação do adversário. Se pergunta «Qual é mais gravosa do ponto de vista ambiental?», está a reconhecer implicitamente que a Marina da Barra é gravosa para o meio ambiente e que a única dúvida que subsiste é a de saber se é mais ou menos gravosa que outros empreendimentos! Trata-se, de resto, de uma argumentação do mesmo calibre da utilizada pelo presidente da CM de Ílhavo: «O terminal químico levou-nos não sei quantos hectares de sapal e não houve nota pública de contestação ao projecto.» Em qualquer um dos casos, não se procura demonstrar a qualidade ambiental do projecto (não se pode demonstrar o indemonstrável...), mas justificar o projecto através de uma moral infantil: se os outros podem, eu também posso! Quanto à Pista do Rio Novo do Príncipe e ao Campo de Golfe de Aveiro, nisso somos capazes de estar de acordo. Contudo, não estou por dentro do assunto, pelo que lhe peço que me envie alguma informação para o meu e-mail que deixarei no final. Já agora: também faz parte dos planos de Ribau Esteves um Campo de Golfe em Ílhavo. Esperemos que mantenha o espírito combativo também relativamente a este campo de Golfe.
2) A segunda pergunta, aliás insinuação, não lhe vou responder. São acusações graves e feitas ao abrigo do anonimato cobarde. Gostaria que o Artur nos esclarecesse melhor sobre o assunto, até porque desconheço por completo a situação por si descrita. Agora, parece-me imprescindível que faça prova do que diz e que o faça dando a cara. Caso contrário, temos todos o direito de o ignorar.
3) O financiamento das ONG está devidamente legislado. Faça o favor de estudar o assunto. Todavia, o exercício de uma cidadania crítica não requer tabela de honorários e nem é passível de tributação fiscal, quem a exerce apenas está a fazer uso dos seus direitos e deveres constitucionais. Era o que mais me faltava: pagarem-me para pensar!
4) Totalmente de acordo! Mas o que tem isso a ver com a Marina da Barra? (Já disse lá atrás o que penso sobre este tipo de argumentação...)
5) Mais uma vez tenho de pedir ao Artur para reler o meu artigo. É que não excluí totalmente a hipótese da construção da Marina da Barra. O que excluí foi a possibilidade de se levar a cabo o presente projecto. As condicionantes ambientais não o permitem, ponto final! A este propósito acho deplorável que Ribau Esteves insista no projecto e que o procure legitimar no Plano de Ordenamento Multimunicipal da Ria de Aveiro. Existem alternativas e vou deixar aqui algumas: 1) Construção de pequenas marinas, despojadas do apêndice imobiliário, ao longo dos braços da Ria; 2) Reformulação do presente projecto de modo a retirar do leito da Ria as infra-estruturas de apoio (em terra existe mesmo ali ao lado o terreno da antiga seca de bacalhau); 3) Redução da dimensão do projecto, abdicando de parte significativa da componente imobiliária; 4) Se existe a intenção de requalificar o Forte da Barra e o Jardim Oudinot porque não instalar aí uma pequena Marina, a qual poderia ter apoio de infraestruturas hoteleiras que a APA pretende aí instalar? (Se a APA pretende ficar com os dois pássaros na mão...); 5) Pura e simplesmente nada construir naquele local e proceder-se à sua recuperação e requalificação ambiental. Esta última solução, que é a que eu assumo como a solução ideal, permitiria salvaguardar a única margem da Ria na Praia da Barra ainda não urbanizada.
f) Alternativas não faltam e a Marina da Barra, tal como a APA e a CMÍlhavo, pretendem não é uma fatalidade. O que é uma fatalidade é a necessidade de se discutir de uma forma aberta e inteligente esta questão. Em última instância, mesmo que a administração central acabe por aceitar o projecto (o que é pouco provável), a população deve ser chamada a pronunciar-se sobre o seu próprio futuro. Em última instância, o debate exigirá um referendo local.
g) Por último, meu caro Artur, como é natural, não defendo essa concepção de ambiente que me é imputada por si, a «de um ambiente a que na sua concepção o homem -o horrível e eterno predador- não deve nem pode pertencer». Não me vou dar ao trabalho de lhe explicar que ninguém, nem o mais ferveroso dos ecologistas, considerará defensável tal posição. O que se passa – e que o Artur não percebe ou faz que não percebe – é que estamos a falar de escolhas para o futuro a longo prazo, que nos comprometem: a nós e a todas gerações vindouras. A verdade é que não somos donos disto, apenas zeladores.

E é tudo amigo Artur. Vá aparecendo, mas para próxima não se esqueça de trazer um nome e, sobretudo, de não perder a face.
Cumprimentos,
David Afonso
attalaia@gmail.com

Melhor Que «Soares É Fixe» Vai Ser Difícil



Já vejo o staff de promoção da hipotética re-candidatura de Mário Soares à Presidência da República indeciso acerca de qual há-de ser o slogan de campanha desta vez: «Soares é curtido», «Soares ganda maluco», «Soares é uma moca», «Soares é baril», «Soares é um bacano», são propostas que poderão vir a estar em cima da mesa.

Dolo Eventual Memória

Flagrantemente inspirado pela RTP Memória, e apesar de o Dolo Eventual ser um blog muito jovem ainda (3 meses e 24 dias...), declaro inaugurada esta minha nova coluna dominical - Dolo Eventual Memória.
Escreveu assim David Afonso, sob a epígrafe «Centro e Periferia», no dia 5 de Abril de 2005:
Um dia destes ao ver Sócrates na televisão revi-me naquele personagem de Nanni Moretti no Aprile ou no Caro Diário (ou até noutro filme, não estou bem certo) que implorava frente ao televisor: «Diz qualquer coisa de esquerda! Por favor! Diz qualquer coisa de esquerda!» (citação não textual). Mas o nosso Sócrates nada nos diz de esquerda. Causa: a esquerda morreu! A direita também! A política morreu! Bom... Talvez o anúncio da morte da política seja manifestamente exagerado. Mas o que é certo é que já não vale a pena sentar meticulosamente os nossos deputados da esquerda para a direita. Já não se arruma assim a casa! Agora é tudo centro! Como quem diz: ninguém sabe ao certo o que é e, portanto, onde se sentar. Para se fazer justiça a esta situação proponho que a partir de agora as cadeiras do parlamento sejam substituídas por um carrossel. Os dois grandes partidos estão engalfinhados um no outro, tornando-se às vezes muito complicado distinguir onde começa um e acaba outro. O que os move é apenas uma força agonística sem sentido, que os faz rodar no vazio um sobre o outro, num movimento perpétuo mas aparente porque não avançam nem recuam. À volta dos partidos do centro gravitam os pequenos partidos periféricos que retiram a sua dinâmica da força gravitacional dos partidos do centro. Também não vão a lado algum porque não dependem de si próprios, a sua natureza é parasitária. De uma forma mais ou menos sistemática vão lançando farpas contra o centro, mas com um cuidado esmerado, não vá o mecanismo avariar e criar-se uma crise como, sei lá!, uma mudança a sério ou qualquer coisa assim. Voltando ao Nanni Moretti frente à televisão. Estão a vê-lo a implorar: «Diz qualquer coisa de periférico! Por favor! Diz qualquer coisa de periférico!»? Eu não. Mas vejo-o a desligar a televisão e sair de casa para comprar um gelado de morango.

sábado, julho 23, 2005

Novas Perspectivas De Emprego Para Os Portugueses

A Volvo pretende utilizar condutores embriagados nos seus testes de segurança, na Suécia. Tudo isto para aferir da fiabilidade dos novos sistemas destinados a emitir um aviso caso o condutor esteja embriagado, cansado ou sob influência de drogas. Portugueses, fiquem atentos.

A Desnecessidade De Certos Inquéritos Em Portugal III

Abri hoje, de novo, a mesma coluna. «Precisamos (...) de vontade comum à volta do reconhecimento de uma situação à beira do abismo que nos ameaça a todos»; «Se a colectividade nacional não apresenta coesão, é porque os portugueses não gostam uns dos outros. E não gostam (...) porque não gostam de si próprios - reciprocamente»; «Um país onde um futebolista, Miguel, e seu contrato dominam os noticiários (...) é um país irremediavelmente condenado à farsa»; «No dia da demissão de Campos e Cunha, decidi ensinar as primeiras palavras de inglês à minha filha de três anos. É que o futuro passa por ela, mas não necessariamente por aqui».

Cavaco Silva, Freitas do Amaral, Mário Soares, Manuel Alegre, Marcelo Rebelo de Sousa, António Vitorino, Alberto João Jardim, Garcia Pereira...

Gostaria de alertar estes senhores para o facto de que a vaga para Presidente da República é só uma. Caso haja ainda mais interessados em concorrer ao cargo, aqui ficam alguns requisitos: a) ter mais de 35 anos [art.º 122 CRP]; b) ter um mínimo de 7500 assinaturas de cidadãos eleitores e um máximo de 15000 [art.º 124/1 CRP]; c) apresentação das candidaturas no Tribunal Constitucional [art.º 124/2 CRP].
Quanto a este último acto burocrático, os virtuais candidatos começam a ser tantos que o Dolo Eventual propõe que as candidaturas possam ser apresentadas nas Lojas do Cidadão.

Leituras

«O senhor Valéry era pequenino, mas dava muitos saltos.
Ele explicava:
- Sou igual às pessoas altas só que por menos tempo.»
(...)
Gonçalo M. Tavares - O Senhor Valéry - Editorial Caminho 2002

O Momento Zen

Cento e treze milhões de euros, para a semana, no euromilhões... Ena, pá!... Isto merece uma pausa filosófica para reflexão.





Há uma forte probabilidade de a posse de cento e treze milhões de euros ser interessante.

sexta-feira, julho 22, 2005

Aniversário

Novo que sou na blogosfera, vou desbravando terreno e descobrindo cada vez mais blogues. Uns bons, outros maus. Na lista dos bons está certamente o Elasticidade, que faz hoje um ano. Parabéns!

Pela Boca Morre O Peixe

Código Civil - Artigo 459º - Promessa Pública
1. Aquele que, mediante anúncio público, prometer uma prestação a quem se encontre em determinada situação ou pratique certo facto, positivo ou negativo, fica vinculado desde logo à promessa.
2. Na falta de declaração em contrário, o promitente fica obrigado mesmo em relação àqueles que se encontrem na situação prevista ou tenham praticado o facto sem atender à promessa ou na ignorância dela.
Avelino Ferreira Torres disse, segundo o Público, no tribunal: "Lacraus é que nunca chamei, e dou 20 mil contos a quem for capaz de provar que eu disse isso". Só que Avelino não estava à espera que a prova apresentada pela contraparte no mesmo processo incluísse uma gravação de uma entrevista sua a uma rádio. Nessa entrevista, Avelino afirmou: "essa oposição maquiavélica que é uma salada de grelos e lacraus e de cobras e de tudo." Agora parece que o pobre Avelino vai ter de desembolsar 20 mil contos à conta da sua língua comprida...

Sexo Na América

O devaneio moralista americano prossegue: uma professora de 24 anos arrisca-se a levar com uma pena de cadeia de 30 anos por ter mantido relações sexuais com um seu aluno de 14 anos.
A relação do Ocidente com a sexualidade sempre foi complexa e repleta de praxes e tabus mais ou menos consensuais. A grande novidade é a passagem desses códigos sociais para letra de lei, processo esse que ganhou especial ímpeto no século XIX e que hoje tem o seu máximo expoente em alguma da sua legislação fundamentalista e evangelicamente histérica (por exemplo: em alguns estados o sexo anal pode dar direito a prisão). Ora, excluindo a questão específica da pedofilia (que é alvo de justa repulsa quer pelos códigos sociais quer penais), a questão da menoridade e do exercício da sexualidade é passível de abordagens distintas e específicas de cada contexto e de cada época. Um facto inegável – os estudos e as estatísticas estão aí para o demonstrarem – é que a iniciação sexual acontece na maioria dos casos antes da maioridade cívica (16 e/ou 18 anos). Na teoria, a culpabilidade do acto sexual só desaparece quando alguém é capaz de exercer o seu direito de voto, de obter a carta de condução ou se consumir álcool num bar ou ainda de comprar uma arma de fogo (nos EUA). Na prática, os limiares institucionalizados pura e simplesmente são desrespeitados porque o poderoso processo de eroticização da cultura ocidental, dispositivo essencial de uma sociedade de consumo, ou seja, da sociedade de exacerbação do puro desejar, exerce uma pressão muito forte sobre a libido do indivíduo. Tudo se resume a este quadro verdadeiramente esquizofrénico: por uma lado, institucionalizam-se regras que penalizam legal e moralmente o livre exercício da sexualidade, infantilizando o indivíduo até a um limiar dificilmente suportável; por outro lado, o fundo em que se inscreve este discurso pseudo-moralista é o de uma eroticidade omnipresente, instrumentalizada e reduzida a uma mera estratégia de manter a ferida o desejo em aberto. A falsa insatisfação é chave do capitalismo contemporâneo.
É claro que há aqui uma sombra, que é a dificuldade que se terá em estabelecer a fronteira etária entre o comportamento sexual legítimo e ilegítimo. Para a nossa sensibilidade europeia uma pena de 30 anos por causa de um acto sexual com um menor (?) de 14 anos é manifestamente desproporcionado. Muitos de nós nem verão aí qualquer matéria de censura moral ou até penal. Mas do outro lado do Atlântico é o que se vê. Mais um sintoma de que a América está a recriar à sua maneira a sua ocidentalidade. Fico a pensar no que poderiam os nossos amigos americanos dizer ao lerem estes versos de 1855 de António Feliciano Castilho:

«OS TREZE ANOS

Já tenho treze annos,
Que os fiz em Janeiro:
Madrinha, casa-me,
Com Pedro Gaiteiro

Já sou mulhersinha;
Já trago sombreiro;
Já bailo ao domingo
Co’as mais no terreiro.

Já não sou Annita,
Como era primeiro,
Sou a senhora Anna,
Que mora no Outeiro.»
(...)

Pérolas

Às vezes, as minhas pesquisas na imprensa do século XIX são recompensadas por pequenas pérolas. Não as procuro, mas farto-me de tropeçar nelas. Esta é uma das minhas favoritas:

«Fusilamento – o tenente-coronel La Torre, do regimento de Cordova, foi provisoriamente fusilado no dia 6 em Saragoça, á frente de toda a guarnição.»
O Jornal do Povo, 18 de Março de 1854

Se Lhe Chamarem Um Dia Sócrates, O Máximo Que Poderá Ambicionar É O Cargo De Filósofo

Caros transeuntes blogosféricos: jamais baptizem de Jarbas os vossos filhos, a menos que curem do futuro deles. Se o vosso filho se chamar um dia Jarbas, o máximo que poderá ambicionar é o cargo de motorista.

Outras Andanças

Um post n'A Baixa do Porto.

quarta-feira, julho 20, 2005

Humanista Humano Precisa-se

Lido no JN do passado domingo, na secção de classificados:


«AUTÁRQUICAS . MAIA
Procuramos Candidatos/as às Eleições Autárquicas pelo Concelho da Maia. Se se sente humanista contacte:
Partido Humanista 967 230 676
Lê-se, mas não se acredita. É nestas alturas que me sinto profundamente desumano. Bom, poderiam pelo menos ter acrescentado: «Um mês de férias com vencimento garantido pelo seu patrão.»
PS: o PH não está sozinho nisto. Desconfio que o PS esteve à beira de fazer o mesmo em Matosinhos e o PSD em Gondomar.

O Cão Humano

Farayadi Zardad (na foto) foi condenado a uma pena de 20 anos de prisão por crimes cometidos no Afeganistão entre 1991 e 1996. Até aqui, tudo bem. Mas parece que o sr Zardad tinha aquilo que os meios de comunicação social têm vindo a chamar de «cão humano». Um cão humano! Esse «cão humano» chamava-se Abdullah Shah e foi executado no ano passado. Passava o tempo acorrentado, fechado num buraco, sendo que de quando em vez o sr Zardad soltava-o para espancar e comer os testículos de algum pobre coitado. E a notícia ficou por aqui. Fiquei curiosíssimo em relação ao «cão humano», pelo que fiquei frustrado por não terem dado mais pormenores. O cão humano tinha focinho? Comia pedigree pal? Ladrava? Articulava palavras? Cozinhava os testículos antes de os comer ou comia-os crus? Tinha atracção sexual por mulheres ou por cadelas? Tinha pulgas? Digam-me qualquer coisa!

A Desnecessidade De Certos Inquéritos Em Portugal II

O pessimismo não é cíclico. É constante. Abrindo, de novo, a mesma coluna, lê-se «[...] Portugal não está em momento de correr riscos»; «É surpreendente a insustentável leveza com que o governo tem vindo a minar a sua própria credibilidade»; «Este sítio não está só muito mal frequentado, como avança alegre e rapidamente para a falência»; «O regime está podre e não se recomenda a ninguém».

Vantagens De Um Governo Impopular

Sócrates, continue o bom trabalho.

terça-feira, julho 19, 2005

A Desnecessidade De Certos Inquéritos Em Portugal

O Eurobarómetro da Primavera, divulgado ontem pela Comissão Europeia, garante que os cidadãos portugueses são os mais pessimistas da União Europeia quanto ao crescimento económico nos próximos doze meses. Não sei porquê tanto trabalho em realizar este tipo de inquéritos em Portugal, quando basta abrir, por exemplo, o jornal Público, na coluna Diz-se: «O país continua mergulhado numa profunda letargia económica [...]»; «Esta primeira década do século XXI passará à História como uma década perdida do crescimento económico em Portugal.»; «Estamos pior do que estávamos há dez anos.»; «O discurso de política económica é cada vez mais confuso e incoerente»; «Portugal gosta de se sentir como uma ovelha e andar desesperado em busca de um pastor.».
Todas estas últimas frases foram ditas por portugueses. Curiosamente, a única frase proferida por um estrangeiro (Poul Nyrup Rasmussen), reza assim «Se todos fizessem o mesmo que Sócrates está a fazer em Portugal, veríamos a economia europeia crescer.»

Marina da Barra II

Resolvi chamar à superfície este comentário ao post A Marina da Barra, por nos dar uma novidade inquietante:

«Anonymous said...
A situação actual é precisamente a de incubação da responsabilidade do consórcio que ganhou a concessão, que, se quiser, poderá apresentar um novo projecto, elaborar o devido EIA e tentar novamente, mas que só com uma alteração muito significativa ao anterior projecto poderá passar em sede de Processo de AIA.No entanto, o que o governo deveria fazer era, com base no resultado do anterior Processo de AIA, reconhecer que o que concessionou no Decreto-Lei n.º 507/99 de 23 de Novembro nunca poderá ser construído como tal, e então, por um novo decreto-lei, anular (ou alterar) os termos da concessão anteriormente atribuída de forma a não concessionar qualquer construção de imobiliário no domínio público hídrico e diminuir radicalmente a concessão de amarrações.Mas o Eng. Ribau Esteves não desiste, e pela sua mão como Presidente da AMRIA, está neste momento e até 22 de Julho (é já dentro de dias o fim do prazo) em dicussão pública (é possível a qualquer um apresentar reclamações) o Plano de Ordenamento Multimunicipal da Ria de Aveiro (salvo erro o primeiro do género no país), no qual o anterior projecto é enquadrado, o que é muito mau já que aumentará o número de instrumentos legais que pretendem legalizar tal monstro de destruição e de NÃO interesse público.O que é aceitável que se desenvolva são mais ancoradouros de pequena dimensão que, de facto, sirvam o interesse das populações no usufruto deste bem precisoso que é a Ria de Aveiro. »
9:44 AM
É admirável a tenacidade do enérgico autarca em defender os interesses de alguns contra os interesses de todos. E nós?

Livro de Reclamações de Domingo (um tudo-nada atrasado): É Tudo Igual!

Pequenos atritos com a realidade: quando pedimos uma Sagres e nos trazem uma Super Bock; quando pedimos um Compal e nos trazem um Sumol Néctar; quando pedimos um Ice Tea (Lipton) e nos trazem um iced tea qualquer (Nestea por exemplo); quando pedimos uma Coca-Cola e nos trazem uma Pepsi-Cola. Mas o maior dos atritos acontece quando o empregado de mesa nos tenta convencer que é tudo igual, que até são todos fabricados no mesmo sítio e que só trocam o rótulo para ganharem mais dinheiro. Foi neste preciso momento que a conversa descambou para a política.

segunda-feira, julho 18, 2005

Portugal De Hoje Visto Por Um Marxista Exaltado

«A dinâmica evolutiva resulta de um processo dialéctico em que cada modo de produção encontra a sua génese no desenvolvimento histórico das contradições do modo imediatamente anterior. Deste modo, o desenvolvimento das forças produtivas, constituídas pelos meios de produção e pela força de trabalho, desagua, a dado passo da História, numa contradição entre estas e as relações desenvolvidas entre pessoas e meios de produção - as relações sociais de produção, que se cristalizam nas formas de propriedade. Assim, para que um modo de produção seja capaz de assugurar o pleno aproveitamento dos seus meios de produção, é necessária a correspondência entre forças produtivas e relações sociais de produção. Ora, em Portugal, essa correspondência não se verifica. Os nosso operariado é permanentemente explorado por este sistema capitalista opressor que vê apenas no lucro o seu móbil e no desrespeito pelos direitos dos trabalhadores o seu passatempo. Nos últimos anos houve um enorme progresso das forças produtivas, enquanto as relações sociais de produção estagnaram, camaradas. Estamos a entrar num período transitório de democracia avançada para o comunismo, de revolução social. Apelo, pois, à vossa consciência de classe, caros trabalhadores, para fazer avançar o motor da História. A abolição da propriedade privada e do direito sucessório deverão ser as nossas duas primeiras metas. Ninguém jamais calará a voz da classe operária!
Viva o marxismo!»

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O Comércio do Porto

O post «Turismo e Policiamento*» n'O Comércio do Porto.

*Também publicado n'A Baixa do Porto.

sábado, julho 16, 2005

Marina da Barra

1. A revista Engenharia e Vida do passado mês de Maio faz capa do projecto Marina da Barra da Ria de Aveiro. O artigo é assinado pelo Eng. Eduardo Gomes da Irmãos Cavaco S.A. e tem por título: «Marina da Barra: Uma Ilha “Conquistada” ao Canal da [sic] Mira». Este título por si só é já meio programa, remetendo-nos para um linguajar belicista que se enquadrará no paradigma oitocentista do Positivismo ingénuo, o qual entendia o progresso como uma luta do homem contra a natureza. Não me vou dar ao trabalho de demonstrar a falência actual e consensual de um modelo do século XIX, mas é com algum desalento que se constata que a competência técnica nem sempre é acompanhada por uma reflexão que lhe faça justiça. Mas vamos ao artigo:

2. Como já é fastidiosamente habitual nestas situações, o autor começa por confrontar o leitor com o que se faz lá fora, no estrangeiro, tentando demonstrar o nosso eterno atraso. É natural que nesse ponto tenha razão, mas tal não o autoriza a afirmar que existe um «deserto de ideias e iniciativas», porque na verdade elas existem, inclusive a proposta de construção de pequenos portos de abrigo e de apoio ao longo dos vários braços da Ria de Aveiro, sem qualquer componente imobiliária e restringindo-se apenas ao essencial em respeito à fragilidade do ecossistema.

3. Não dando, portanto, como dado adquirido que este projecto de Marina é a única solução possível, passemos à análise de alguns pontos da argumentação de Eduardo Gomes, ficando desde já estabelecido que não abordarei qualquer questão de ordem técnica para qual nem possuo a devida formação para a poder discutir e que nem é sequer o que me interessa aqui discutir. Aliás, do ponto de vista do mero exercício de engenharia o projecto é no mínimo sedutor. Só que estamos aqui a falar de algo muito concreto e demasiado importante para se reduzir a uma mera questão técnica. À margem da exposição técnica fez-se recurso a processos argumentativos que merecem ser discutidos:

a) Evoca o Plano Director do Porto de Aveiro, elaborado na década de 70 pelo eng. Vasco Costa e no qual se previa um serviço de apoio à náutica de recreio;

Todo o país ganhou com o desenvolvimento do Porto de Aveiro nas suas diversas valências (comercial, industrial, químico, pesca longínqua e costeira) e, de facto, o Plano Director original teve aqui um papel essencial. Mas a factura ambiental estamos agora a pagá-la. O processo de betonização das margens da Ria, a poluição química das águas e dos lodos e o espectro do desastre ambiental que pesa sobre todos os residentes da área de influência do Porto de Aveiro são consequências desse mesmo Plano. Foram opções que gostaríamos de não ter sido obrigados a fazer, mas entre o desenvolvimento económico e a preservação ambiental compreende-se que, naquele momento, a escolha tenha recaído sobre a primeira opção. Mas já não estamos nos idos anos 70 e, por isso mesmo, os dados não são exactamente os mesmos. Só para nomear dois dos mais importantes: ao contrário de então, as margens da Ria possuem uma forte densidade populacional que convive com a estrutura portuária e hoje em dia as questões da ecologia e da preservação da qualidade de vida são questões que marcam a agenda política e, em alguns países, a agenda empresarial. A evolução das circunstâncias observada nos últimos anos não nos permite ancorar um projecto com a dimensão do da Marina da Barra num quadro de há duas décadas atrás, o qual pretendia responder a outro tipo de problemas e de necessidades. E o facto de o tal Plano Director prever a existência estruturas de apoio à náutica de recreio nada legitima, porque concerteza que nunca previu a dimensão agora pretendida e muito menos ainda um investimento imobiliário acoplado.


b) Evoca o Decreto-Lei n.º 507/99 de 23 de Novembro, que autoriza a Administração do Porto de Aveiro (APA) a concessionar por um período de 60 anos [!] a construção e exploração de uma marina (apoio à navegação, abrigo portuário, comércio e indústrias complementares) com 850 [!] lugares para embarcações até 35 metros;

Apesar de considerar seis décadas um período demasiado longo para qualquer concessão e de considerar que 850 lugares um número manifestamente exagerado, não é por aí que quero pegar neste ponto. Acontece que o Decreto-Lei em causa colide com outra legislação, a saber: com o Decreto-Lei n.º 384-B/99 de 23 de Setembro que criou a ZPE (Zona de Protecção Especial) da Ria de Aveiro, pelo qual se procura acautelar a preservação de várias espécies de aves, o que implica um cuidado especial com o sapal e sistema de lodos. O Decreto-Lei n.º 507/99 de 23 de Novembro, por sua vez, vem a situar a área de concessão mesmo em cheio na ZPE entretanto definida por legislação anterior! Como se não fosse suficiente, nunca é demais recordar que o próprio Decreto-Lei que enquadra o projecto é auto-contraditório porque se o preâmbulo não acolhe a possibilidade de edificação no próprio leito da Ria (dados os constrangimentos inerentes à integração desta na Rede Natura 2000), já o articulado parece fazer tabula rasa do anteriormente dito, admitindo a edificação das habitações, hotéis e demais instalações no mesmíssimo local anteriormente salvaguardado!

c) Queixa-se da «burocracia de um país que teima em manter-se imóvel em questões estruturantes e potenciadoras das actividades económicas»;

Desta vez não é uma questão meramente burocrática, até porque tanto quanto se saiba não há nenhum parecer encravado nalgum ministério ou autarquia. O que se passa é que houve uma decisão política, confortada por pareceres técnicos superiores, que contrariou as expectativas irrealistas da Sociedade de Desenvolvimento e Exploração da Marina da Barra de Aveiro (na qual o BPN tem uma posição importante). Perante isto só há uma coisa a fazer: repensar o projecto em termos ambientalmente aceitáveis, deixando cair os devaneios imobiliários. Seja lá como for, não me parece que a APA fique de mãos a abanar, até porque, segundo ouvi dizer, tem um outro projecto imobiliário e turístico para o Forte da Barra do outro lado da Ria.

d) Lamenta que «a mesma Administração que num momento promove este empreendimento, noutro momento hesita e “desmobiliza-se” num processo que, se não tiver outro fim, seguramente descredibiliza o País e a sua capacidade de mobilizar investimento»;

Não deixa de ser curioso este lamento, porque o comportamento errático da Administração central já se tinha manifestado antes, aquando da promulgação dos dois Decretos-Lei acima referidos e aí o Sr. Eng. Eduardo Gomes não viu qualquer inconveniente. A Administração também num momento promoveu a protecção da Zona Húmida da Ria de Aveiro e, noutro momento hesitou e “desmobilizou-se” num processo, no mínimo incoerente e – acredite – lesivo para a imagem do País. Que crédito podemos dar nós a um País que em Setembro se propõe a proteger uma área ambientalmente sensível e em Novembro do mesmo ano se propõe a permitir a edificação de um projecto imobiliário megalómano (sim, porque é apenas disso que se trata afinal de contas) nessa mesma área? Como se vê, até estamos de acordo no que diz respeito à essência do problema, só que não faço despoletar a minha indignação ao retardador como o Sr. Engenheiro dos Irmãos Cavaco, S.A.


e) Não termina sem alertar de que este projecto é «ansiosamente aguardado pelas populações da região da Ria de Aveiro».

Não consta que cagaréus, gafanhões, vareiros e outras populações que convivem com a Ria tenham alguma vez pedido seja lá a quem for uma Marina. Não senhor, não consta no rol das aspirações das populações ribeirinhas tal exigência. Agora se me falasse, por exemplo, da despoluição da Ria ou da devolução da Ria e das suas margens a quem de direito (a todos nós), aí sim! Agora uma Marina... Demais a mais esta questão é muito mais melindrosa do que se possa à partida julgar.
Ribau Esteves, Presidente da Câmara de Ílhavo e entusiasta do projecto, chama a si o direito de decidir sobre o futuro do seu próprio Concelho, não hesitando afirmar-se como porta-voz da população local. Ora, se alguma vez vierem a ser ultrapassados os constrangimentos legais e o veto político da Administração central, sugiro ao autarca que dê uma lição de democracia e dê oportunidade à população local de se pronunciar por referendo relativamente a esta obra que irá condicionar em muito o futuro de cada um. O autarca, desta vez como porta-voz do promotor, terá ainda afirmado que «O terminal químico levou-nos não sei quantos hectares de sapal e não houve nota pública de contestação ao projecto.» (Ahhh! Eram bons velhos tempos, não eram?). Em vez de desvalorizar o impacto ambiental do projecto, talvez fosse mais útil, pedagógico e inteligente obrigar o promotor a assumir uma maior responsabilidade cívica e ambiental, até porque foi para isso que o elegeram, ou não?! Por outro lado, uma coisa é construir ao longo das margens, outra construir no próprio leito da Ria, a qual não pertence ao Concelho de Ílhavo, mas, em primeiro lugar, a todos os concelhos banhados pela Ria e, em segundo lugar, ao País. Por este motivo são justas e fundamentadas as críticas do Presidente da Câmara de Aveiro à pretensão da construção da Marina da Barra. Agora que se aproximam as eleições autárquicas, talvez fosse o momento de cada autarca da ria tomar uma posição sobre o assunto. Não se pode permitir que o assunto fique a hibernar até que apareça uma conjectura política mais favorável (na prática: que o ministro certo esteja no ministério certo e o autarca certo na autarquia certa). Será que a Marina rende votos? Faça-se o teste.

5. Para quem não está bem por dentro do assunto deixo aqui a Marina da Barra em números:

- Área total da Concessão: 586 686 m2*
- Área molhada: 268 663 m2*
- Área seca: 318 023 m2*
- Área verde total: 131 151 m2*
- Espaços verdes de uso privativo: 85 206 m2*
- Espaços verdes de uso colectivo: 45 945 m2*
- Áreas privadas de utilização pública: 13 220 m2*
- Área total de vias: 36 620 m2*
- Áreas pontes: 2072 m2*
- Área total de passeios: 57 761 m2*
- Área total de estacionamento em superfície: 4442 m2*
- Volume do aterro para construir a ilha artificial: 700 000 m3*
- Hotéis: 2**
- Moradias: 130**
- Apartamentos: 420
- Lugares para embarcações: 858**
- Lugares de estacionamento automóvel: 1756**

- Oferta existente para embarcações de recreio: 1773 (+1171 a seco)**
- Número de escalas/ano previstas: 50**

(fontes: *Artigo da revista Engenharia e Vida; **Outras fontes)

6. Problemas que poderão resultar da concretização da Marina da Barra:

- Ocupação de Zona Protegida;
- Destruição do ecossistema lodoso e do sapal;
- Perda do habitat natural e consequente pressão sobre a sobrevivência de espécies piscícolas e de aves (incluindo aves migratórias);
- Alteração da dinâmica das correntes e dos bancos de areia, podendo ter um impacte imprevisível da segurança da Ponte da Barra;
- Abertura de um precedente perigoso de desrespeito pelas ZPEs;
- Aumento da pressão imobiliária sobre a Ria e sobre a própria Praia da Barra;
- Impacte irreversível sobre as actividades tradicionais (salinicultura, pesca, apanha de bivalves,...)
- Congestionamento das vias de tráfego (já actualmente saturadas);
- Excessiva pressão demográfica sobre o lugar da Barra

7. Nasci e cresci em Aveiro até me mudar para o Porto. Foi na Ria que aprendi a nadar, onde aprendi a pescar e, sobretudo, aprendi esta coisa estranha que é comoção perante a natureza. Para quem não é de cá, para quem nunca habitou as suas margens e desconhece o ritmo das marés e das aves migratórias, para quem nunca saboreou uns burriés ou umas amêijoas com uma cervejinha no Cais da Bruxa, para quem nunca mergulhou nas águas do esteiro do Jardim Oudinot, para quem não trata os barcos bacalhoeiros pelo seu nome próprio como se de uma pessoa se tratasse (o «Brites», o «St.ª Teresa», o «St.ª Mafalda»,...), para quem nunca sentiu com prazer a névoa que se levanta da Ria, para quem nunca atravessou em romaria a Ria para as bandas de S. Jacinto, para esses acredito que a Ria possa ser um braço do mar a ser conquistado. Para nós, não. Mesmo sabendo que não se é feliz duas vezes no mesmo sítio, gostaria de, pelo menos, dar a oportunidade aos que aí vêem de serem também eles felizes por aqui.


(Fonte da Imagem: http://ortos.igeo.pt/ortofotos )

Subscrição

«Que dizer de dirigentes sindicais que convocam greves, que implicam para os grevistas perda de remuneração dos dias de greve, e que depois pretendem receber a remuneração do dia de greve como se não tivessem feito greve, invocando dispensa de serviço para trabalho sindical? Há alguma moralidade nisso?»
Subscrevo inteiramente.

sexta-feira, julho 15, 2005

Zona Jota

O Partido Socialista tem Jota. O Partido Social Democrata tem Jota. O Partido Popular tem Jota. O Bloco de Esquerda não tem Jota, mas tem um grupo de jovens aficcionados que nos acampamentos ad hoc e nas workshops de desobediência civil encontram a desculpa perfeita para fumarem charros longe do alcance censor dos respectivos progenitores. O efeito dominó não se fez esperar: agora é o Partido Nacional Renovador que tem uma Juventude Nacionalista, no intuito de «doutrinar» os mais novos e cuja estratégia passa pela distribuição de propaganda nas escolas e estar perto das associações de estudantes. Ainda bem que, muito provavelmente, só será distribuída propaganda a jovens de sangue puro lusitano: se assim for, os panfletos não serão distribuídos.

Faz Lembrar a Educação Portuguesa: Muito Investimento, Altos Níveis De Insucesso

Os repórteres da Antena 3 (tenho quase a certeza que foi nessa rádio) estavam há pouco ocupados numa entrevista. A pergunta era «o que é que fazia se lhe calhasse os 81 milhões de euros do jackpot do euromilhões?», à qual um entrevistado respondeu sem hesitar «primeiro, ficava desempregado; depois, comprava um bom ponta de lança para o benfica».
Com cidadãos deste calibre, abnegação e altruísmo, com este espírito empreendedor e de iniciativa, sempre predispostos a apostar e investir no seu próprio país por forma a fazê-lo crescer e prosperar, pergunto eu, tomando por modelo-padrão este sr entrevistado: como é possível que o crescimento económico seja microscópico, os empresários portugueses pouco competitivos, a produtividade baixa e a evasão fiscal a regra? Há algo que não bate certo.

Do Poder Do Teatro

Um fenómeno que ocorra no seio da sociedade, das duas uma, ou é novidade ou já aconteceu. Se é novidade deixa de o ser, se não o é, então é-nos familiar. Seja como for, estará ligado ao repositório de imagens na memória pelo funil da representação. Será pela representação que vou fazer sentido, que me vou ligar e sentir em casa, que vou ao encontro dos desejos, das imagens. Pertencer e ser reconhecido, são essas as forças que giram à volta das imagens. As imagens, quanto a elas, são frutos de poder e de desejo. Assim as imagens respiram, tornam-se receptáculos – aglomeram e formam grupos, massas e comunidades. Assim estabelece-se o teatro do grande drama social possuir pela imagem. Irei usar a imagem para criar e gerir o meu domínio ou então pôr-me no lugar dela para eu próprio ter e ser poder. Vamos atrair, fascinar, dar prazer, meter medo, enganar, incendiar com as imagens. Vou mergulhar, ser possuído e deixar-me levar pela imagem… alimentarei grandiosidades, futilidades e obsessões… farei tudo pela imagem… abraçarei, criarei e destruirei ideologias… passarei despercebido, serei anónimo, neutro, eremita, marginal, anarquista, artista, niilista, dentista ou deputado, inconsciente, descerebrado ou ruminante, serei líder, voz do povo e da razão, mão do bem ou do mal, deus das cunhas e influências, um ídolo sexual…
Imagens que irão determinar e alimentar a potência do grupo, a sua fantasia, a sua força e hierarquia…
As imagens são mais e menos que imagens, imagens casa, imagens contra imagens. Teatro total de olhos fechados que as imagens souberam ocupar…

Enquanto as imagens não forem vistas como imagens, enquanto as imagens forem sempre mais ou menos do que imagens, teremos teatro...

Porto/Lisboa

O Partido Socialista parece disposto a tudo para perder as Câmaras de Lisboa e do Porto: para a primeira, foi buscar Carrilho que de bom só tem a Bárbara; para a segunda, Assis continua barricado em Bruxelas a ganhar 15 mil euros/mês. «Óh, homem! Venha cá ao Porto fazer um bocadinho de campanha!» «Agora não posso... Só quando entrar de férias!» Com Carago!

quinta-feira, julho 14, 2005

O Comércio do Porto

O post «O Progresso É Relativo» publicado no O Comércio do Porto

Sr Empresário e Sr Trabalhador:

Sr empresário:
falamos de evasão fiscal quando o contribuinte oculta ilegitimamente ao fisco parte ou totalidade da sua matéria colectável (contrabando, descaminho, falsas declarações contabilísticas, inter alia). Sr empresário: se o tributam por ter uma sanita a mais, tenha uma sanita a menos; se o tributam por ter olhos claros, faça um transplante; se o tributam por andar, esteja parado. Extremis causa, corte a cabeça. Porque tudo isto não entra no conceito de evasão fiscal, é tudo perfeitamente legal e legítimo.

Sr trabalhador:
partindo do conceito de evasão fiscal há pouco referido, não lhe adianta tentar a remoção do imposto. Com a ilusão da remoção o sr trabalhador contribuinte transfere o imposto, no todo ou em parte, para um incremento da matéria colectável. Ou seja, o sr pobre trabalhador, tendo um rendimento disponível de 10 e cobrando-se-lhe um imposto de 10%, viu o seu rendimento disponível reduzido a 9. E, na pouco avisada tentativa de remover o imposto, o sr trabalhador vai laborar precisamente até atingir um número ilíquido de 11.1, que lhe permita, após tributação, perfazer um valor aproximado dos iniciais 10. Sr trabalhador, não vá por aí: é impossível remover um imposto. O que o sr trabalhador está apenas a fazer é a trabalhar mais – menos qualidade de vida – e a pagar mais ao Estado – o que também, as mais das vezes, não será o melhor. Mas, se o quiser fazer, também aqui, como em cima, saiba que não está a praticar evasão fiscal.

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Turismo e Policiamento*

É preciso termos cuidado com o que pedimos, não vá alguém nos fazer a vontade. Principalmente quando no referimos à segurança e ao policiamento. Eu próprio já dei por mim a exigir mais e melhor policiamento para a minha rua, para a baixa, para a cidade toda. Ora, na segunda-feira à noite fizeram-me a vontade: como tinha a visita de um amigo que não conhecia o Porto e como estava uma noite de calor insuportável, resolvi convidar o meu camarada a tomar um copo à beira rio, na Ribeira. A dado momento estaciona uma carrinha da policia mesmo à nossa frente, impedindo-nos de ver o rio Douro (que era afinal de contas o nosso propósito). Lá de dentro sairam alguns homens do Corpo de Intervenção (presumo...) que ficaram por ali... entre as esplanadas e o rio! Acreditem que me foi muito difícil convencer o nosso amigo de que a Ribeira é um sítio muito seguro e que aquilo era apenas uma demonstração de zelo das forças policiais. Desconfio que não ficou convencido. Pergunto-me se as zonas turisticas não deveriam ser alvo de um policiamento mais especializado e, sobretudo, discreto.
*Publicado no A Baixa do Porto

quarta-feira, julho 13, 2005

TGV, OTA e Crescimento

Keynes concluiu que o investimento se multiplica em rendimento através do consumo induzido pelo investimento inicial nos períodos ulteriores [multiplicador do rendimento]. Um exemplo: a um aumento de investimento de 10 Unidades de Conta [UC], corresponde uma aquisição de 10UC em bens capitais durante esse período. As empresas produtoras desses mesmos bens capitais fazem subir as suas vendas em 10UC, distribuindo-os em, nomeadamente, salários. Os titulares desses salários gastarão em consumo este rendimento, de acordo com a sua propensão marginal ao consumo. Sendo esta de, por exemplo, 7/10, o acréscimo de investimento de 10UC provocará um aumento de 7UC no período seguinte – o que se traduzirá num aumento correlativo das vendas das empresas produtoras de bens de consumo. E assim por diante, nos períodos sucessivos, infinita mas decrescentemente.*
Embora o Estado só vá assumir uma parte da factura, não deixa de ser uma fatia substancial. O Estado é também um importante impulsionador da economia, designadamente em ciclos económicos recessivos. A construção do TGV e da OTA terão, estou convencido, uma palavra a dizer no crescimento da economia.
*Porém, se o Estado financiar exclusivamente com impostos as suas despesas, assistir-se-á à diminuição correlativa do poder de compra das famílias. Temos assim, por um lado, a despesa do Estado capaz de se multiplicar em rendimento; por outro lado, a diminuição do consumo das famílias por via do pagamento de impostos [multiplicador negativo dos impostos], pólos que virtualmente se anulam (Trygve Haavelmo). Situação esta que poderá ser corrigida com despesas-transferência (v.g. subvenções), no mesmo período (ou, com um menor impacto, em períodos ulteriores), para as famílias, devolvendo-lhes o poder de compra [multiplicador positivo dos impostos].

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O Progresso É Muito Relativo...*

Quando passava pelo Jardim de S. Lázaro assisti a uma zaragata de proporções homéricas. Ao que parece uma matrona tinha, em boa hora, resolvido puxar pelos galões matrimoniais e ir buscar o esposo que por ali vadiava. O alarido gerado foi qualquer coisa (in)digna de ser vista. Entre tabefes e insultos em bom velho vernáculo nortenho (que aqui prefiro não reproduzir), umas três dezenas de populares empenharam-se em nos dar um espectáculo o mais triste possível. Não é a primeira vez que assisto a coisas destas naquele jardim: entre residentes da suecada, a prostituição descarada e os indigentes que assombram os bancos, cria-se um ambiente de abandono e marginalidade, no qual os pacotes de vinho barato por ali espalhados dão o toque final. A meio da tarde, ao passar por ali perto, na Praça dos Poveiros, tropeço noutra zaragata. Desta vez alguém, não sei porque motivo, sovava num daqueles desgraçados que por ali acampam ao sol. A multidão parecia gozar e ver naquilo alguma espécie de justiça. O Jardim de São Lázaro e a Praça dos Poveiros, mesmo no coração da Baixa, são, hoje, territórios tomados pela marginalidade e pela prostituição. Por coincidência, nesse mesmo dia encontrei na BPMP esta notícia no O Jornal do Povo de 18 de Julho de 1854:
«Concurrencia – Entre as pessoas que no domingo á tarde frequentaram o jardim de S. Lazaro, contou o Ecco, os snrs. Francisco Xavier Ferreira– Alexandre Herculano – Silva Amaral – visconde d'Azevedo – Sebastião d'Almeida e Brito – conde de Saldanha – Antunes Navarro – D. Rodrigo –P.e Villaça – Lima – João d'Albuquerque Forbes – Figueiredos – Manoel Guedes – Bandeira – Dr. Vieira – Sinval – Gonçalves Basto – Sousa Dias– Amorim, e muitos negocientes, advogados, proprietários, militares e cavalheiros respeitaveis, etc. Além d'esses, andavam lá também, os dignos membros da comissão administrativa do Asylo, os snrs.: - Manoel de Clamouse Browne – José Joaquim Pinto da Silva – José da Silva Passos – José Joaquim Pereira de Lima – João Baptista de Macedo, e o director e capelão o P.e Gonçalo Affonso Cyrne.»
Isto do progresso é muito relativo...
*Publicado no A Baixa do Porto

terça-feira, julho 12, 2005

Danos Colaterais

«Medicamento contra Parkinson estimula compulsão para o jogo.» Poderia ter sido pior: o medicamento poderia estimular compulsão para comer os restos do lixo.

As Sentenças do Vasco

Ao contrário de E. Prado Coelho, não acho que para Vasco Pulido Valente «pensar é dizer exactamente o contrário do que as pessoas pensam. Sempre, invariavelmente.» Já dei por mim a pensar exactamente o mesmo que Pulido Valente. Por exemplo, no Público de 08 de Julho: «Quando se escreve sobre a elite portuguesa em 2005 é prudente lembrar que ela paga para ler o Expresso e, se calhar, o lê com gosto. Esse pequeno acto, na aparência inofensivo, exprime e resume a sua inutilidade prática. Para quê falar dela?» Quem poderá discordar de tal sentença?

Caso Decidido Na Alemanha

A, querendo ver-se livre do marido, convence-o a beber um licor envenenado, prometendo que também ela se suicidaria logo a seguir, o que não fez.
Fonte: Comentário Conimbricense ao Código Penal, Tomo I
E ele foi nessa.

Em Que É Que Nos Distinguimos Dos Animais?

Trinta e nove pessoas queimadas vivas na República Democrática do Congo por terem apoiado as forças de manutenção de paz das Nações Unidas.

segunda-feira, julho 11, 2005

Safa!

Marques Mendes foi desconvidado para o arraial madeirense. Pensamento do pequeno líder: «Safa!»

Luxemburgo Diz 'Sim'

domingo, julho 10, 2005

O Livro de Reclamações de Domingo: A Lagarta

A falta de higiene nos restaurantes é um problema de saúde pública. Demasiadas vezes tenho de almoçar e jantar fora de casa, pelo que sou particularmente vulnerável a episódios tristes. Não se julgue, no entanto, que é um perigo exclusivo das tascas e restaurantes modestos. Este Sábado fui jantar a Ovar numa coisa a que os autóctones apelidaram de «o melhor restaurante de Ovar», mas que só tem de bom o facto de estar virado para a ria. A coisa dá pelo nome de «Oxalá». Não vou falar da qualidade [sofrível] da comida, não vou falar do serviço [indigente], não vou falar da decoração [pirosa]. Vou falar de badalhoquice mesmo! A dado momento, enquanto mastigava com zelo ruminante aquilo que num gesto de boa vontade, concedemos o título, por ventura exagerado, de salada, uma bonita lagarta subiu energicamente pelo meu garfo acima. Convenhamos que, mesmo para um amador da vida selvagem – como eu gostaria de ser – o recontro com aquela fera segregadora de baba não era lá muito oportuno e, por isso, consultei o empregado sobre este belo, mas indesejável, brinde. Com uma eficácia singular o bom serviçal prestou-se a conduzir a lagarta à presença do cozinheiro. Estava feita! À noite sonhei com o pobre bicho. Pela manhã fui assaltado pela indignação: «Co’s diabos! A lagarta era minha! Eu paguei-a! E o cozinheiro é que ficou com ela?», seguido do remorso: «A lagarta era minha propriedade! Eu era responsável por aquela vida, não a deveria ter deixado ficar nas mãos daquela gente...»

Pronto, É Agora Que Os Terroristas Vão Parar Definitivamente

Segurança e Direitos Fundamentais

Os fins não [ou nem sempre] justificam os meios. A segurança não deve ser conseguida à custa de direitos fundamentais elementares da pessoa humana.

sábado, julho 09, 2005

Coca Cola Regressa Ao Iraque Cerca De Quarenta Anos Depois


Foto: http://mstu.cz/~bozek/obrazky/Fun/C%20-%20D/

Aos poucos, os Estados Unidos vão amortizando as despesas com a guerra.

99+1

Hoje o Dolo Eventual faz 100 dias. O nosso estado de graça acabou.

E Agora, Algo Completamente Diferente...















Para quem ainda sacode a caspa dos ombros dizendo: «Ainda bem que não foi em Portugal.» Pois não! Foi em Londres, no coração financeiro e económico, já para não falar cultural, da União Europeia! Do ponto de vista puramente egoísta e económico esperemos que os londrinos, incluíndo a enorme comunidade islâmica, saibam dar a volta à situação de uma forma bastante rápida. Isto é: que voltem a trabalhar a cem por cento já na próxima segunda-feira porque alguém tem de nos pagar o subsídio de sobrevivência nacional.
(fonte da imagem: www.flickr.com)

sexta-feira, julho 08, 2005

Como Chegámos Até Aqui?

Como chegámos até aqui? Não alinho nessa família de teorias que tudo justificam como sendo um episódio de uma milenar luta de civilizações. Na verdade, não me parece que o confronto com o mundo islâmico fosse uma inevitabilidade. Os ataques terroristas como os a Nova Iorque, Madrid, Londres e os já esquecidos ataques a Paris (em princípio não atribuíveis à Al Qaeda, mas islâmicos na mesma), eram impensáveis nos anos 50, uma hipótese académica nos anos 60, pouco prováveis nos anos 70, prováveis nos anos 80, inevitáveis nos anos 90 e nos nossos anos 10 tornaram-se num hábito. Sim, num hábito apesar de tudo. Quem, ao ouvir a notícia dos atentados em Londres, não pensou: «Outra vez»? Dos anos 50 à actualidade ocorreram uma série de fenómenos que directa ou indirectamente ajudaram a construir o presente quadro geo-estratégico: a guerra-fria e a divisão do mundo em blocos (leste/oeste); a imposição do estado de Israel; a descolonização e emergência de novas nacionalidades, o fim da guerra-fria e emergência de outras novas nacionalidades; a laicização definitiva da ocidentalidade e a redescoberta da força política e social do Islão; a deriva consumista do Ocidente; a hiperconcentração de riqueza no hemisfério norte e consequente nova divisão do mundo em dois blocos (norte/sul); a omnipresença (hard e soft) do Império Americano e a globalização/ocidentalização. É neste labirinto que devemos inscrever a história do terrorismo islâmico. Não existem roteiros simples.

Observemos de novo a cronologia: a aparecimento de fenómenos de movimentos anti-ocidentais, agressivamente anti-ocidentais, acompanha a escalada consumista-capitalista e à medida, claro, que a dependência do petróleo se torna maior. O terrorismo islâmico não se distingue pelo seu ressentimento contra o Ocidente, porque nisso – acreditem – não está só. O que o distingue é o facto de ter poder suficiente para levar a cabo operações complexas de grande impacto mediático, sociológico e político. E de onde vem esse poder? Do financiamento dos petrodólares! Isto quer dizer que alimentamos o terrorismo de duas maneiras: ideologicamente, porque menorizámos e desprezámos o mundo islâmico, empurrando-o para a miséria, e porque o nosso apoio incondicional e acrítico a Israel se torna o deflagrador perfeito; materialmente, porque o nosso consumismo alimenta-se do petróleo, que por sua vez alimenta estes grupos. A verdade é que o nosso sucesso, o nosso crescimento, faz-se à custa do resto do mundo. É natural que se defendam como podem.

É um erro grosseiro querer fazer passar a ideia de que o terrorista é um louco. Ele ama a morte e professa uma espécie de nihilismo que lhe permite tudo, inclusive, matar inocentes e matar-se a si próprio. Em parte isto é verdade. Não pode deixar de ser verdade. Mas na realidade é algo mais do que isso. São homens e mulheres que acreditam ter perdido tudo, para quem o mundo, de facto, já acabou. Já anteviram o fim da história. No fundo, não são muito diferentes de nós próprios: também somos afectados por um nihilismo estranho, que nos leva a repudiar a essência do tempo a favor de um eterno presente, de um culto da beleza erótica e da juventude, esgotamo-nos a nós e ao mundo numa brincadeira sem fim, chamada capitalismo, na qual se nos devemos empenhar ao máximo, enfim, devemos ser competitivos e ganhar mais do que outro porque sim. Se isto não é nihilismo... E também somos indiferentes perante a morte: por semana quantas pessoas morrem no Iraque? E em África? Que nos importa a China? E as moles humanas da Índia? E a pena de morte nos E.U.A? Que nos importa isto se temos um telemóvel da última geração?

A este propósito apetece-me escarrar na hipocrisia britânica! Deu-lhes um surto de dignidade e de respeito para com os mortos. Com os SEUS mortos! Na BBC não passarão imagens de sofrimento, nos tablóides não se fará a exploração da dor, nenhum jornal ganhará dinheiro com o sangue dos mortos. Quando nos toca a nós, que somos Pessoas, existem valores mais altos, existe o respeito. Ora, não consta que a agora pudica BBC se tivesse furtado a transmitir as imagens horríveis de Madrid ou do tsunami. Todas as televisões, neste mesmo dia, continuaram a difundir imagens dos outros mortos, dos mortos deles, do Iraque. Esta atitude é demonstrativa de que existe uma desvalorização do Outro, uma redução da morte do Outro à condição de entretimento televisivo. Amanhã todos saberão quantos britânicos morreram no atentado, mas ninguém saberá quantos iraquianos inocentes morreram no Iraque à custa dos meticulosos erros das forças de ocupação. Aliás, o facto de me ver na necessidade de especificar que os iraquianos de que falo são inocentes e de não sentir a mesma necessidade relativamente aos britânicos, só demonstra o quanto eu próprio sou capaz de ser hipócrita. É uma questão de ocidentalidade.

Outras Andanças

Mais dois posts meus no A Baixa do Porto: aqui.

Imagine-se Se Fosse o Menos Vigiado

quinta-feira, julho 07, 2005

É Esta a Qualidade Da Nossa Oposição?

O discurso da direita, nomeadamente da direita personificada em Luis Marques Mendes, denuncia o evidente: a direita pediu emprestado o gravador ao PCP, e engoliu-o. Marques Mendes vem afirmando com regularidade - porque não terá mais nada para afirmar - que o PS não cumpriu o seu programa eleitoral ao aumentar os impostos. Mas eu pergunto: choque fiscal com descida de impostos, numa tal campanha eleitoral de uma certa coligação, que os subiu assim que chegou ao governo - há esforço de anamnese que o faça lembrar?

Geografias

Esta onda de comoção à volta dos atentados no ocidente em geral choca-me. Horas e horas de telejornais. Não que haja seja o que for de errado no pesar pela perda de vidas humanas, muito pelo contrário. Mas é que quase todos os dias há atentados no Iraque, geralmente recheados de vítimas, e parece que ninguém dá por isso. Nem mesmo [quase] os media. A vida humana vale mais ou menos conforme a geografia.
Se o atentado de hoje tivesse sido no Iraque teria por principais responsáveis Blair e Bush, que um dia resolveram violar o direito internacional público, fundamentando a sua conduta nas armas de destruição em massa invisíveis. Se o atentado de hoje tivesse sido no Iraque, aposto que Blair não tinha abandonado a reunião dos G8.

O Verdadeiro Inimigo da Democracia

Nada pior para a democracia do que comportamentos como o de Miguel Almeida. O antigo chefe de gabinete de Santana Lopes vai assumir o seu lugar no parlamento, podendo assim usufruir do conveniente estatuto conferido pela imunidade parlamentar. Trata-se de um comportamento em tudo coerente com o trajecto desta personagem secundária da politiquinha nacional. Honra e verdade são virtudes estranhas para quem se dedicou a fazer a guerra suja do ex-primeiro ministro. Quem está enterrado em merda até ao pescoço, também não pode ter qualquer tipo de pudor democrático.

É O Meu Descrédito

Criei há uma hora atrás um blog para acabar de vez com a minha credibilidade. O Blog Expiatório.

quarta-feira, julho 06, 2005

As Conversas Que Eu Ouço Inadvertidamente Na Rua

«O seu filho está melhor?» «Ainda está um pouco manco, mas já esteve pior.» «Ele tem ido ao fisioterapista?»

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Alberto João Entre Os Seus

O mais infame dos partidos nacionais, o Partido Nacional Renovador (PNR), elogiou os devaneios xenófobos do presidente do Governo Regional da Madeira. Pois é, Alberto já encontrou um partido à sua altura. Outra alternativa interessante para o nosso clown favorito poderia ser esse viveiro de salazaristas não assumidos que é o CDS/PP, até porque já confidenciaram à comunicação social a sua compreensão pelas palavras do Grande Soba.

O Dolo Eventual Exige Uma Voz Feminina e Sensual

Cheguei hoje à (novíssima) estação de comboios de Aveiro. Ainda está em obras, mas está quase concluída. Quando estiver pronta, será uma das mais modernas do país. Mas ia eu por um dos túneis quando, de súbito, eis que se me surge à epifania a voz daquele que anuncia a chegada e partida dos comboios: sempre com a mesma voz aguda e desagradável, de apresentador de carros-de-choque, com pronúncia de locutor de rádio do Estado Novo.
E eu cá para mim: «Já estragaram tudo.»

O Pequeno Átila

Marques Mendes, o pequeno Átila, decapitou, degolou, extirpou, calcou, cuspiu, chateou e incomodou os velhos chefes populistas do clã dos bárbaros laranjas. Depois de ter internado no esquecimento colectivo Santana Nero, fez queimar na praça pública o Major Loureiro e o Suíço Isaltino. As hostes laranjas, de norte a sul, saúdam o novo príncipe. Todos? Não! Numa longínqua ilha, o Soba Jardim continua a lambuzar-se na gordura do populismo mais sujo do mundo. Marques Átila Mendes tem um bracinho demasiado curto para lá chegar. Os bárbaros murmuram, perplexos pelo poder daquele selvagem que se recusa a prestar homenagem ao novo príncipe. O flagelo do PSD retira-se para comer o seu Bolycao com leite. Que ganda nóia!...

terça-feira, julho 05, 2005

Heil Jardim!

O Parlamento da Madeira chumbou o voto de protesto contra os mais hodiernos rosnares de Beto Joãozinho Jardim. Segundo rumores de viajantes e aventureiros, o Parlamento da Madeira prepara-se também para, após data a designar por uma comissão independente presidida por Luís Marques Mendes (que estuda a oportunidade e o mérito das medidas de cariz político), adoptar como norma o cumprimento «Heil Jardim» entre os madeirenses. Quanto às sanções, vão desde processos disciplinares (se funcionários públicos) a coimas (se simples cidadãos). Fala-se também da angariação de fundos para a construção de um bunker para o Führer.

segunda-feira, julho 04, 2005

Outras Andanças

Um post meu n' A Baixa do Porto

Os Parasitas

O inigualável Narciso Miranda reconheceu em público que o grande problema de Matosinhos é que 70% dos projectos que dão entrada para apreciação da Câmara são da autoria de funcionários da própria autarquia. A sinceridade do autarca é tocante, mas creio que se deveria fazer alguma coisa relativamente a esta situação. Afinal de contas, o que se passa se não é crime, é o quê? Para mal dos nossos pecados em todas as autarquias deste país, do Minho ao Algarve e Ilhas, todos os arquitectos e engenheiros por elas contratados fazem uma perninha cá fora, contornando a lei de uma forma muito simples: basta que um sócio, um camarada de um Concelho vizinho, um mercenário, enfim um canalha qualquer assine o processo na sua vez. Claro que na prática esse processo será avaliado pelo seu verdadeiro autor, violando muitas das vezes as normas de edificação e urbanismo mais elementares e passando à frente dos bons idiotas que preferem trabalhar com um técnico independente, fora da câmara. E ninguém faz nada contra estes parasitas?!

João Jardim, o Iluminado

Alberto João Jardim
Só me resta remeter para o que escrevi há uns tempos sobre o homem.

A Penhora Amigável Ou O Sr Exequente Foi Executado

«Bom dia sr executado!» «Olá, como está, sr exequente?» «Bem, obrigado, sr executado! E a família, vai boa sr executado?» «Como sempre, sr exequente! E notícias do processo executivo, sr exequente?» «Parece que há aí uns embargos de terceiro, sr executado.» «Ah... e eu deduzi oposição à execução e oposição à penhora, sr exequente.» «O sr só me atrapalha a vida, sr executado!» «Ora essa!, sr exequente. Pois não foi o sr exequente que intentou um processo executivo contra mim, sr exequente?» «É verdade, sr executado. Não nos zanguemos por tão pouco. Venha daí um abraço, sr executado!»
(Abraço longo. Passa uma senhora do outro lado da rua. «Devem ser paneleiros», pensa.)
«Bom dia, sr executado!» «Olá sr Silva!» «Já sabe o que aconteceu ao sr exequente, sr executado?» «O que foi, sr Silva?» «O sr exequente foi atropelado por um comboio, sr executado!»
(Silêncio. Passa outra vez a mesma senhora. «Lá está outra vez o paneleiro», pensa.)

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domingo, julho 03, 2005

O Livro de Reclamações de Domingo: Longe da Vista, Longe do Coração?

O último post do Pedro inspirou-me na criação de uma nova linha de posts: O Livro de Reclamações de Domingo. Uma vez por semana vamos dar largas à rabugice contra as pequenas e insignificantes contrariedades da vidinha. Seguindo o caminho aberto pelo Pedro vou intitular a minha primeira contribuição desta linha: Longe da Vista, Longe do Coração?

Não me conformo com essa moda de em alguns restaurantes, não obstante a sua modéstia e impreparação do pessoal, a garrafa do vinho ficar fora do alcance da manápula do cliente. A intenção será, talvez, a de criar um ambiente sofisticado e de bom gosto, no qual não se aceita essa coisa bárbara e terceiro-mundista da garrafinha em cima da mesa como nas tascas. Porém, o resultado é o inverso porque esta gente que abre uma casa a pensar mais no visual e no ambiente do que na comida e conforto do cliente, pura e simplesmente não sabe servir! Os copos vão ficando vazios à medida que a refeição e a conversa discorrem para o seu fim natural. Mas a garrafa não! Fora do nosso alcance, permanece quase intacta, intocável até que o alguém, certamente apiedado da nossa sede lá se digna de os tornar a encher à pressa. E isto, acreditem, estraga qualquer refeição. O vinho não pode ser racionado! Quero a botelha em cima da mesa! Quero as gloriosas nódoas de vinho tinto de volta aos meus jantares! Mais vinho e menos sede! Peço desculpa por algum excesso, mas ainda me sinto transtornado pelo que me aconteceu aqui na velha e tasqueira Invicta num restaurantezeco pretensioso chamado Gira-Pratos: estava a tomar o café sagrado, quando a menina ao se aperceber de que ainda havia um restinho de vinho na garrafa, que com malícia escondera nas minhas costas, tratou de o servir! Lá existe escândalo maior? Vinho com café! Ah! Se tivesse a botelha à mão não teria sobrevivido o vinho até tão tarde!